sexta-feira, 13 de abril de 2018

Teogonia (1) Monte Helicon

A Teogonia de Hesíodo começa com o "Monte Rodopiante", tradução livre de "Monte Helicon", uma montanha que se situa perto de Delfos, na Grécia.

Este rodopiar está também na estrutura helicoidal do DNA, e curiosamente podemos encontrar essa estrutura não apenas em escadas, ou parafusos sem fim, e noutras obras arquitectónicas, mas também em poses singulares de bailado, ou em simples poses de modelos... porque em qualquer um destes casos, o rodopiar helicoidal, confere uma ideia de elegância, no nosso sentido estético. De certa maneira, é como se a própria estrutura helicoidal do DNA programasse o nosso gosto pela sua forma geométrica.

Gostei de fazer o pequeno exercício de traduzir os primeiros versos da Teogonia numa perspectiva diferente, em que as divindades são associadas ao seu significado, e não a simples nomes, o que torna a enumeração enfadonha.
Por exemplo, em grego, podemos ler Dia, exactamente assim, mas depois é traduzido, nas múltiplas versões, como uma designação de Zeus. Se lemos Cronos, devemos lembrar que está associado ao Tempo... por muito que queiram separar letras posteriormente inventadas. Esta tradução vai assim chamar fonte profunda à fonte Hipocrene, associada a Pégaso, muitas vezes traduzida como fonte do cavalo. Como "hipo" tanto serve "cavalo" ou "abaixo", a tradução procura um conveniente sentido do conjunto, e não qualquer literalidade.


Teogonia, de Hesíodo 
(1-62)

Cantemos com as moças do Monte Rodopiante, de grande e divino rodopiar, e que, com pés suaves, dançam em redor da Fonte Iodina, altar do Dia, o potente filho do Tempo.
Quando banham os seus ternos corpos nos permissivos rios, ou na fonte profunda, atingem o mais alto rodopiar, movendo-se em rápidos passos. 
Assim se erguem e emergem da noite, e pelo véu da espessa neblina saúdam o Dia quando desponta. Saúdam a Era de argumentos caminhando sobre sandálias duradouras, as Aves de acutilantes olhos, e a Luz que pelo Arco do Sol dispara os primeiros raios.

Quadro de Peruzzi (Séc. XV) - Apolo, com o Arco que dispara Raios de Sol, e as nove musas:
Calíope, Clio, Erato, Melpómene, Terpsicore, Polímnia, Euterpe, Tália, Urânia.


Saúdam o Mar que envolve a Terra, veneram o Temer, o Amor e olhos doces, a Jovialidade duradoura, o belo Crepúsculo, a Ferida, o Esquecimento, e o Tempo conselheiro. A Alvorada, com o grande Sol e a brilhante Lua, também são saudadas, tal como a Terra, o grande Oceano, a escura Noite, e toda a raça de entidades imortais.

Certo dia, quando Hesíodo pastoreava os seus carneiros, nas encostas do sagrado Monte Rodopiante, ensinaram a bela canção, dita pela deusa às filhas d'O limpo Dia que tem a égide:

- Pastores silvestres: Vis infâmias, ventres balofos, sabemos alimentar, tal como falsidades por verdades passar, mas ensinando, sabemos a verdade desvelar.

Assim disseram as filhas do grande Dia, dando-me um bastão e uma coroa de louros, segredando em voz divina as coisas que antes foram e serão, mas não para falar de si, do princípio ao fim. 
- Falo na pedra ou no carvalho?
"Alla ti e moi tauta peri drun e peri petren?" - irrelevância - divagar sobre a pedra e o carvalho?

Venham com as musas que alegram o espírito d'O limpo Dia com palavras que foram, são e serão. 
Assim corre o fluxo doce das suas bocas, ressoando e alegrando a morada gelada de Zeus e dos imortais do Olimpo. Elas, com a sua voz imortal celebram em canção o Início, saindo os deuses da Terra e do Céu (ou seja, de Gaia e d'Ourano).
Depois falam de Zeus, pai de deuses e homens, e de como ele é excelente entre os deuses. Cantam da raça de Homens e Gigantes, e as moças filhas da égide do Dia, alegram o coração d'O límpido Dia.

Entre as Danadas, a Memória, que reina nas colinas Libertadoras, gerou a união com o filho do Tempo, em esquecimento de males e repouso de lamento. Pois, durante nove noites esteve o Dia consigo, entrando no sagrado leito, longe dos imortais. E, quando o ano passou, e as estações se formaram do desvanecer dos meses e dos dias contados, ela gerou nove filhas, em harmonia de pensamento, cujos corações estão em canção, e cujo espírito é livre, como topo d'O limpo nevado.
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PS ... umas estão mais literais que outras, "entre as Danadas" resulta de "em Pieria", mas Pieria não é apenas um local, é o nome da mãe das Danaides. Além disso, Eleutério significa libertador.

Falo em pedra (nota: sobreiros são carvalhos).   Falo em carvalhos (imagem: bolota).


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