- Portanto, a situação é a seguinte. Desenvolvemos separadamente várias linguagens, e praticamente todas levaram a conceitos abstractos semelhantes. Não exactamente iguais, porque evoluiram a partir de tradições diferentes, mas há correspondentes, há traduções.
- E o mito de Babel? De uma língua única, que se confundiu?
- Pois, não sei, é um pouco indiferente, depois cada um assumiu os seus partos...
- ... ou os seus medos.
- ... ou os seus caldeus - essa piada não está já gasta?
- Depende do canto, das áreas, ou melhor, dos árias... do povo que se espalhou por várias áreas, levando os seus carneiros, os seus Aries. A sua castidade, a sua pirâmide de castas, remeteu outros à condição de escravos. Se havia deuses, eles quiseram imitá-los, quiseram ser invisíveis e condicionar a estrutura social pelo topo.
- Estás-te a referir à maçonaria?
- Será uma face mais visível dessa pirâmide de influências, que também já teve expressão nas castas da nobreza. Nobre, não obre... era esse o seu mote, até há pouco tempo era poluto a um nobre trabalhar.
- Também na religião...
- Sim, também aí foi e é visível. Mas se a pirâmide de Babel subiu alto, ao ponto de se não lhe ver o topo, também foi a gravidade imposta, que a fez cair. Porque quando se acumula muita massa, só lhe percebemos o peso quando o imposto for grave... e aí temos a queda dos graves.
- Isso também tem um significado económico!
- Tem, mas essa multiplicidade de significados foi em parte feita pelos próprios, para benefício da sua comunicação em código. Sabes, um crédito passa a dívida com a simples mudança de sinal. É só um sinal...
- Seria grave...
- Nem por isso. Vê os desvios que foram feitos. A etiqueta usou os nomes como etiqueta do corpo. Quis dar importância ao nome em vez de dar importância à palavra, porque lhes custava a lavra da cultura. Usou escravos (os cravos), usou servos, que precisam agora de "ser voz", de ser vós. Um simples nome serviria de chave, e não o texto. Porém a clave de sol apenas dá início à partitura, sem as notas seguintes não há música. E essas notas é que são as verdadeiras notas...
- Sim, mas o que é então a noção hélgia? Um nome?
- Não... é a palavra que falta.
- O quê?
- A questão é que não sei se falta alguma palavra para comunicarmos. Aparentemente não.
- Mas aparecem palavras, noções novas, frequentemente, até pelos avanços tecnológicos, pelo desenvolvimento de novas teorias, etc...
- Ok. No entanto, não é isso. É claro que se virmos um novo animal lhe devemos dar uma nova designação, o mesmo se passando com objectos, etc... A questão é do ponto de vista de conceitos abstractos, não ligados aos sentidos. Usamos uns milhares de palavras, mas também poderíamos usar apenas algumas centenas, bastaria racionalizar e evitar sinónimos. Os novos conceitos são explicados através de palavras já existentes, alguma vez precisaram de palavras inexistentes? Ou seja, há muito as línguas chegaram a um ponto de serem autossuficientes. Conseguem explicar através das palavras que já existem os novos conceitos.
- O que queres dizer é que a partir da infância, em que aprendemos o essencial, depois basta um dicionário e uma explicação clara.
- Isso! Agora a questão que coloquei, há bastante tempo atrás, seria a de saber se uma comunidade poderia ir mais longe.
- Uma comunidade?
- Sim, sozinho não se consegue desenvolver linguagem. Precisamos dos outros para aferir se esses conceitos têm existência nalguma realidade abstracta partilhada. A realidade individual, dessa dá conta o próprio por completo. A linguagem é uma experiência comunitária e para ser explorada por completo deve envolver todos.
- A noção hélgia seria a palavra que faltava, ou o desenvolvimento de nova linguagem?
- Pouco importa, provavelmente será antes a palavra que falta para indicar que não nos faltam palavras.
- Posso-me juntar ao pessoal da lavra?
- Claro...
- Aquela história do vídeo com a mudança da rotação da Terra... era por causa do trânsito de Júpiter?
- Olha, olha, ficou preocupado!
- Vocês é que andam a apoquentar...
- Quem? Só se for quem quer ser apoquentado, ou quem apoquenta.
- Aquilo foi uma brincadeira... bom, ou talvez não! Depende do crédito que deres a registos antigos sobre mudança da rotação da Terra. Vê aqui este texto. Segundo indianos, gregos, mexicanos, egípcios, houve quatro mudanças do sentido da rotação da Terra. Certamente que o teu positivismo científico não foi beliscado por este negativismo místico de abelhudos maias... n'est pas?
- Ah! Ah! Ah!
- Acho que ele ficou preocupado, ficou.
- Não vejo porquê... ele tem a convicção da ordem que não se deixa poluir pelo caos. As leis todas escritas, não é? Confiança, só se for com fiança. Eh! Eh!
- Há leis físicas, sabiam...
- Claro que há... são a parte da previsibilidade que nos conforta. Mas também há a imprevisibilidade que nos diverte... ou apoquenta, depende da tolerância e dos medos. Se conseguisses meter o universo inteiro nas leis, em que universo se teriam escrito essas leis?
- Não sei, mas podemos verificá-las experimentalmente.
- Achas que por algumas coisas funcionarem hoje como um relógio, a corda não tem princípio nem fim... ou que não há desacertos?
- Não é só isso, o empirismo dele é útil, mas não é autossuficiente. Deduz leis, mas não consegue mostrar a razão delas existirem. Mede a constante de gravitação, mas só à força de uma fé, que repudia na religião, pode dizer que aquele valor foi, é, e será constante.
- Sim, imagina que o peso que o Sísifo teve que suportar adicionalmente foi um peso adicional no seu corpo, por simples aumento da constante de gravitação?
- Lá estão vocês com os mitos. Nesse caso teria sido ele e todos os outros... ou os outros continuavam aos saltos na Lua?
- Queres falar sobre a Lua? Sobre as fotos?
- Não, vocês estão sempre a gozar, e eu nem sei o que estou aqui a fazer...
- Não te furtarás...
- Mas estou-me a fartar, vou-me embora.
- Ninguém te está a atar. Tu é que gostas de lavrar em ata (aqui dá jeito usar o novo acordo, eh! eh!).
The Verve - Bitter sweet symphony
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