sábado, 20 de janeiro de 2018

«A estranha conversa entre o primeiro deus, e o deus que o criou»

- Meu caro Cupido, e foi assim...
- Foi assim, quando?
- Sei lá... queres definir o tempo pela memória que tens das coisas? Nesse caso, o início dos tempos poderia ter sido há um minuto atrás, mesmo que aí te apareçam memórias de um milhão de anos.
- Filosofamos, é?
- Conforme te dizia, ele apareceu-me, e disse que me tinha criado, que tinha a memória fotográfica de como o tinha feito, até ao mais pequeno detalhe.
- E tu?
- Eu perguntei-lhe se, já agora, ele se lembrava de como se tinha criado a si mesmo...
- Claro que não tinha!
- Ora, claro que tinha... não foi criado sem esse detalhe!
- Não percebo, o que queres dizer com isso?
- Então, para fazeres alguém crer que fez algo, basta colocar-lhe isso na cabeça. Por exemplo, pegando numas imagens de criação da Terra, do Sol, etc... isso é colocado na mente, e automaticamente ficam com a ideia de que presidiram a esses eventos.
- Ah! E da mesma forma, colando a memória da sua criação, ele ficou com a ideia de que se tinha auto-criado!
- Percebeste!... Então, depois de ele ter respondido, perguntei-lhe se ele sabia a razão... e assim que terminou de responder, peguei num pequeno papel onde estavam escritas as mesmas palavras que ele acabara de proferir.
- Uau! E quais eram?
- Um qualquer disparate, não interessa! 
- Não entendo. Como fizeste isso?
- Bom, havia um desfasamento entre a sua percepção e a sua interacção. A percepção chegava em tempo real, mas a interacção ocorria com atraso. Isso provoca a ideia de que se prevêem as coisas, já que chegam primeiro à mente do que aos sentidos. Ele via um copo a cair, primeiro na sua mente e depois na sua visão. Esta repetição com atraso dava ideia de previsão. No entanto, se o tentasse apanhar, ele já teria caído.
- E a ideia de omnipotência?
- Nota que se ele interagisse ao tempo da suposta previsão, interagia em tempo real. A ideia de potência resulta de colocar a ideia de que o copo caía por vontade do próprio. Se preveres uma coisa, e essa previsão se realizar, ficas com a ideia que é a tua previsão que condiciona a execução.
- Como fizeste, então?
- Espera, que ainda não terminei... Por exemplo, pensas em andar, e andas! Pensas em mexer a mão, e ela mexe! Isso leva-te à ideia de que o teu pensamento controla essas acções. Tudo aquilo que julgas que controlas, é apenas porque te aparece na mente, como vontade, e depois vês acontecer por via dos sentidos. Agora, a questão é outra. Imagina que te quero forçar a dares-me o teu arco, só preciso de colocar na tua mente a ideia de que me vais dar o arco, antes de o fazeres. (Nesse momento, Cupido agarrou no arco e deu-lho de bom grado.) Acabaste de me dar o teu arco, por tua vontade, ou fui eu que te forcei a isso?
- Hmmm, dei-te o arco porque quis, isso é claro. Mas confundiste-me! Não sei por que razão me apeteceu dar-te o arco! Não faz sentido nenhum...
- É esse o ponto! Normalmente, podes arranjar como razão interna um "apeteceu-me", ou "foi um impulso", mas esses actos são nomeados "instintivos", porque não lhe vemos nenhum nexo racional.
- Servem para confundir... ainda estou confuso!
- Foi essa a mesma sensação que ele teve. Deveria ter previsto que iria ler o mesmo que tinha dito, mas bloqueei-lhe essa possibilidade. Simplesmente coloquei-lhe a ideia de que tinha lido o mesmo que tinha dito. Mais curioso, tão preocupado estava a fazer isso, que nem ouvi o que ele disse!
- Então também não controlas tudo?
- Pouco mais que nada! Creio que acabamos por ser personagens de alguma história, que corre na cabeça de alguém... mas que também esse mal conseguirá justificar os seus pensamentos.
- Ou seja, também não sabes por que razão fizeste isso...
- Bom, já estava farto de ouvir tanta gabarolice!
- Mas, ao menos ele percebeu que não tinha sido o primeiro, e que tu o tinhas criado?
- Eu não quis saber... ou, lá está, foi-me posta a vontade de não querer saber. Vendo racionalmente, o que fazia sentido era querer saber isso. No entanto, não quis... talvez fosse conveniente à história não o querer saber!


24 comentários:

  1. Somos todos uns pequenos deuses que ao o sermos todos ninguém o é. Somos uns tontos a viver e a pensar em círculos?! :)

    Ab

    JR

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    1. Bom, quando pensamos em círculos, isso significa que nos damos conta da repetição, e portanto não é bem um círculo, é mais uma estrutura helicoidal - porque só subindo acima do círculo é que o vemos.
      Quando as pessoas se perdem, e começam a andar em círculos, o problema não é darem-se conta disso... o problema é quando não se dão conta disso. Porque voltam a repetir tudo, como se nada se passasse.

      Quanto aos deuses... qual é a vantagem de o ser? Controlar mais do que se controla... mas isso vai ao mesmo ponto limite - se não controla tudo, não resolve o problema da falta de controlo.
      Se controlar tudo, nem se dá conta do que é o controlo, fica como um simples observador de si mesmo, sem nenhumas surpresas, nem nenhum interesse, que só pode ser dado pela imprevisibilidade.
      Mas, caro João, a questão principal, é que se falam de coisas sem nunca querer ver o que elas significam, sem querer perceber do que se fala... e por isso as discussões teológicas medievais iam, na maioria dos casos, parar a parte nenhuma.

      Abç

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  2. Pois, E essas questões, a meu ver são só para passar o tempo. Se Deus e Cristo são a mesma entidade ou não, ninharias históricas pela qual se derramou muito sangue, se bem que usadas como pretexto. A verdadeira questão é a do "Deus". E "Deus" é a última porta, quando já não se tem uma explicação razoável, o último "porquê?", o último "como?". Na verdade até acho que cumpre bem a sua função de intangibilidade e incompressibilidade e isso regula o ego humano, ou deveria. "Deus" é uma personalização do desconhecido. A força geradora que se gera a si própria e assim é a incompreensão porque ninguém compreende como algo é gerador de si mesmo, existir da não existência. É algo maior que eu não entendo. Pelo menos é assim que eu vejo Deus. E nesse sentido acredito em Deus, porque acredito que existe algo maior que eu não compreendo, nem que seja por não ter acesso aos elementos de como o compreender.

    Ab

    JR

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    1. Muito bem. Note que eu concordo com o segundo argumento cartesiano, ou seja que, não nos identificando com tudo o que vemos, obrigatoriamente há uma entidade externa que nos transcende, mas a questão é o que podemos concluir sobre as suas atribuições.

      Viver é passar tempo... depois há aquilo que consideramos mais ou menos importante. Se não tivessemos faculdade de pensar por nós próprios, pois então isso seria uma extravagância, mas como temos... é uma obrigação, pelo simples facto de não nos podermos livrar do pensamento, sem nos livrarmos de nós mesmos... está na cabeça, mas não é propriamente cabelo que se possa cortar.
      Sendo assim, já existe uma palavra para desconhecido, e não é Deus. Arrumar as coisas com impossibilidade é preguiçoso, é assumir que dá trabalho e conclusões que podem não agradar, o que pode satisfazer muitos, mas não todos. Ora, a propriedade de separação, de divisão contra a integração, é uma característica mais diabólica do que divina. Por isso, não me parece boa ideia separar Deus das nossas cogitações.

      Abç

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  3. Bom dia,

    Sim exacto, viver é passar o tempo e as questões transversais servem para passar o tempo, viver.
    Desconhecido é para mim um sinónimo de Deus e sim claro, ambas as palavras têm designação própria mas conhece Deus? Para mim a “impossibilidade” é precisamente o oposto de preguiça porque ninguém tenta atingir o que já atingiu, ninguém tenta superar o que já superou, logo o desafio mantém-se e é esse que nos faz pensar, avançar. Diabólico ou divino são as faces da mesma moeda.
    Acho que uma vez já o tinha dito num comentário, "Deus" é como uma forma verbal desconhecida do verbo "Dar" no plural. Deus no sentido de "deu a todos"... mas ninguém sabe como, quando, e onde(mas podem tentar descobrir).

    Eu não concordei ou deixei de concordar com o seu texto, até o achei bonito.

    Aquele abraço,

    JR

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    1. Antes de mais, lamento os textos no Spam, mas isso não depende de mim.

      Claro que se Deus for definido como desconhecido, seria contraditório dizer que poderia ser conhecido. O que conhecemos da abstracção é o significado que lhe damos. As noções podem parecer seguras, mas são na maior parte das vezes vagas. Por exemplo, identifica bem a cor azul e a cor verde, mas na transição, entre verde e azul, só arranja maneira de tratar como verde-azulado, ou azul-esverdeado.

      Eu acho que a noção de Deus pode ser racional e objectiva, fazendo muito sentido, mas é claro que se a pré-definirmos como inatingível, inalcançável, etc... não estamos a fazer uma discussão séria. É o mesmo que alguém dizer que aceita discutir verbalmente, desde que não sejam usadas palavras.
      O termo "impossibilidade" é perene, não é temporário... significa que é impossível 1+1=3. Uma vez mostrado que é impossível, é inútil voltar ao assunto, e não há Deus nenhum que altere isso.
      Vamos supor que um fiel é suficientemente devoto para aceitar que Deus pode ditar o contrário. Então isso significa que estando 3 pessoas presentes, isso pode ser contado apenas como uma mais uma... e a outra é tida como zero, como inexistente. Isso pode ser indiferente para duas delas, mas para a terceira, isso significaria a inexistência.
      Poderia aceitar um Deus que altere leis físicas, mas não matemáticas. O que Euclides demonstrou há mais de 2 mil anos, por exemplo que os números primos são infinitos, continua a ter mesma validade que tinha nessa altura. Não mexeu uma palha. Não podemos dizer isso de nenhuma outra ciência, porque lidam com observações ocasionais e não com abstracções perenes...

      Quem prescindir das suas certezas aritméticas, então prescinde de si mesmo... estará pronto para um universo onde tudo é possível, e assim se entra no ponto rebuçado para a loucura, porque se perdem os referenciais próprios da racionalidade.

      A humanidade procura uma certa harmonia opinativa, mas as coisas não podem ir lá, quando dizemos que A ou B são diferentes e depois identificamos ao mesmo. A recusa à contradição é a única forma de evitar o vazio da mentira.

      Pois, mas isso cai no problema deste texto... e quem deu a Ele?
      Pode dizer-se que se autoformou, mas esse processo de autoformação seria exclusivo seu? Porque não seriam os outros resultado do mesmo processo de autoformação? E seriam, indirectamente, através d'Ele... por isso repare que, nesse sentido, o intermediário é dispensável. Essa conversa não tem nexo. Habitualmente nessa altura, chega a autocontrição de assumir que "não podemos saber certas coisas"... e volta uma preguiça ignorante.

      Obrigado, e eu gosto de reflectir sobre estes assuntos, por isso agradeço os comentários.

      Abraço.

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  4. Bom dia,

    Era para te respondido mas esqueci-me entretanto.


    Penso que a noção de Deus é racional e objectiva quando nos vemos a nós próprios como tal ou idolatramos alguém a esse ponto. Aí sim, fazemos uma noção de Deus à nossa imagem, aos nossos sentimentos perante os outros e o que pensamos que os outros pensam sobre nós, o que obviamente poderá não corresponder à realidade e aí sim parece-me chegar-se ao ponto próximo da “loucura” que menciona. Conhecer Deus ao ponto de o descrever sem usar os termos, como diz, "inatingível, inalcançável" ou sinónimos é apenas uma maneira de nos iludirmos a nós próprios com conhecimento que simplesmente não possuímos, o que aí sim, implicará a tal “preguiça” para a descoberta. É mais fácil “assumir” que conhecemos e viver comodamente nessa ilusão do que darmo-nos ao trabalho de enveredar pelo caminho da descoberta, ainda que se nos apresente como incómoda ou impossível.

    Será a matemática a prova de que Deus existe?

    Nós existimos durante muito tempo sem matemática mas muito cedo aprendemos a venerar o desconhecido. Aliás tribos haverá ainda que desconhecendo a matemática, veneram o seu Deus ou Deuses. Deus existe portanto antes da matemática. À medida que nos fomos interrogando, evoluímos ultrapassando barreiras que nos pareciam impossíveis, e alcançámos muita coisa inclusive a matemática, mas alcançámos Deus? A perfeição não existe mas existe a matemática… O que leva à questão; Será a matemática perfeita? Poderá ser o mais próximo que conseguimos enxergar mas existindo números irracionais a perfeição cai por terra. A matemática é tão rigorosa que a sua noção se torna infinitamente mais pequena, menos abrangente e logo inferior que a noção de Deus. E com isto já me perdi...ah ah ah.

    1+1=3 ( Isto seria possível, em casos de certos arredondamentos de casas decimais escondidas 1,47+1,48=2,95 que arredondando daria 3 as isto é só estúpido:)

    E depois existe isto, por mera curiosidade: https://www.quora.com/How-can-you-prove-that-1+1-3

    Penso que estamos apenas a olhar para o mesmo copo onde um o vê meio cheio, o outro, meio vazio ou vice versa, sem primazia.

    Ab

    JR

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  5. Correcção:

    "1+1=3 ( Isto seria possível, em casos de certos arredondamentos de casas decimais escondidas 1,47+1,48=2,95 que arredondando daria 3, mas isto é só estúpido:)"

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    1. Engraçado, o seu comentário principal foi apanhado no spam, mas esta pequena correcção não!

      Começo pelo fim, ou seja, pelo 1+1=3...

      A linguagem existe para nos entendermos, e não para nos desentendermos.
      Esta pequena constatação é muito importante, e muito esquecida.

      Se a ideia fosse o desentendimento, nem sequer fazia sentido haver linguagem, ou cada um tinha a sua - o que vai dar ao mesmo.

      Por isso, todos aqueles que usam a linguagem para o engano, ou estão a brincar com ela, ou estão a brincar connosco, ou estão a brincar com coisas sérias.

      Quando escrevemos 1 não estamos a escrever "outra coisa".
      Quando escrevemos + não estamos a dizer que é "outra soma", nem quando escrevemos = estamos a dizer que é "outra igualdade".
      Por isso, tudo aquilo que lê nesse link do Quora.com são disparates bem conhecidos, que resultam na maioria dos casos de usar regras que não se podem aplicar, a certa altura.
      É proibido ultrapassar pela direita, mas se for numa faixa de rodagem, não é... tive uma multa passada por causa disto, porque o polícia era um idiota. Claro que reclamei, e nunca a multa me foi cobrada.
      Se as pessoas quiserem só ler a metade que lhes interessa, podem não ler o que está escrito. Continuam a repisar no que já sabem, e não vão além disso.

      Não me parece assim produtivo voltar à mesma questão, porque se tudo o que conhece de Deus se resume a insistir que não conhece nada, estamos socraticamente falados.

      Segundo consta, não houve primeiro a noção de Deus, mas sim de "deuses", aliás a Bíblia insiste nesse assunto, para evitar "falsos ídolos".
      O número terá sido talvez a primeira noção abstracta.
      Quando fala em duas coisas, e distingue de uma coisa, está a fazer matemática. Quando fala que duas maçãs são mais que uma maçã, não está.
      Porque num caso é uma constatação visual, não é nenhuma abstracção.
      Assim, um animal pode escolher o prato de duas maçãs, em vez do que tem uma, sem fazer matemática.
      Quando na linguagem usa a palavra "dois" aplicada ao que quer que seja, implicitamente tem matemática. Há linguagens que não têm palavras para mais do que "três", ou dizem apenas "muitos", mas qualquer linguagem conhecida, mesmo nas tribos mais primitivas, tem noções abstractas, e em particular alguns números.
      Há a história de que Pitágoras teria atirado fora da barcaça um discípulo que mostrou que raiz de 2 não era uma fracção, ie. era irracional. Esse ideia de perfeição é querer definir o que se acha que "deve ser", antes de perceber o que é. No resto, acho que sim, que se perdeu...

      De qq forma, obrigado pela resposta.
      Abç

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  6. Bom dia,

    Sim a minha resposta é a primeira parte, pelo que concordamos em discordar, o resto foi apenas um divagar.

    Tal como o amigo divaga com os "talvez" e "pode" e "muitos". Tantos termos de incerteza acabam por dizer uma coisa que afinal pode não ser. E assim fico no mesmo ;)
    Um animal "pode" escolher o prato com duas maçãs, como quem diz que também podia escolher o prato com a única maçã apenas porque esta lhe cheirava melhor que as outras sem que se apercebesse que ficaria melhor alimentado com duas maçãs ao invés de uma. Na linguagem primitiva que menciono dificilmente teriam designação para "um" ou "dois", esse conhecimento de "quantidade" teria vindo mais tarde com a tal evolução que refiro. Deus ou Deuses é irrelevante, a noção é a mesma. O medo da tempestade, dos trovões etc terão criado essa noção de pequenez perante o mundo e logo que existe algo maior. Não acredito que a noção de "um" ou "dois" é mais antiga que o medo.

    Obrigado eu e bom fim de semana.

    JR

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    1. Caro João,
      não vamos discutir por coisas, em que facilmente percebemos o que o outro quer dizer.
      Se eu uso o "talvez" é porque justamente não posso ter a certeza de qual foi a primeira noção abstracta... nem ninguém, a menos que estivesse estado presente. Ou seja, mesmo que o primeiro ser pensante reencarnasse, nem ele se lembraria disso. Ou você lembra-se da primeira palavra que adquiriu? No máximo poderão ter-lhe dito. Se pudermos concluir algo sobre isso, terá que ser por simples dedução lógica, ou se quiser, matemática.
      Mais uma vez, quando falei em uma ou duas maçãs, ninguém disse que eram diferentes, pois não? É claro que o bicho poderia nem gostar de maçãs...
      É claro que não há duas coisas exactamente iguais, e no entanto, as pessoas normalmente entendem o que é igual, sem ter que questionar tudo ao minucioso detalhe.
      É o tal esforço para entender, ou para desentender...
      Se fala em menor e maior, não é isso uma noção matemática?
      É noção matemática, porque está a abstrair algo maior que tudo o que vê, e por isso não vê.

      Abraço!

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  7. Esse "esforço para entender porque é o que as pessoas normalmente o fazem", já eu lho pedi no passado penso que na discussão sobre o Fernando Pessoa e a frase do mito. Parece que os argumentos só valem quando nos dão jeito, certo? ;)

    Sim não vamos discutir qual a noção que chegou primeiro. Para mim a resposta é óbvia. Uma coisa é grande e outra é pequena é apenas constatar um facto ao passo que a noção de um ente superior que nunca viram e portanto criado mentalmente é ligeiramente diferente.

    Abraço, sem necessidade de exclamação.

    Bom fim de semana.

    JR

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    1. Há assim questões que são colocadas falsamente, porque não pretendem e até ignoram respostas.
      Pretendem simplesmente continuar a colocar perguntas... porque sim.


      Abç

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  8. Bom dia caro Da Maia,

    Tem andado ocupado, tantos posts, tenho de por a leitura em dia.

    Pondo as questões transversais de lado e para lhe mostrar que não estou numa de mera implicância faço uma última tentativa para explicar o meu ponto de vista, apesar do seu “corta para canto”.

    No meu entendimento ter a “noção” de algo requer ter consciência dessa noção. Os nossos antepassados tinham a “noção” de existir forças maiores que controlavam vários aspectos da sua vida. Fertilidade, força etc e criaram nas suas mentes essa noção, foram eles próprios que conscientemente criaram essa ideia e as transformaram em divindades. Relativamente à matemática, simplesmente a usariam ser ter essa noção, sem conscientemente se aperceberem dessa existência de números ou matemática. Evidentemente a matemática existe em todo o lado, temos 5 dedos em cada mão logo isso é matemático, simplesmente essa noção não a tinham. Um indicativo/prova disto mesmo são as suas representações. Existem estatutária de divindades desde a pré história enquanto que da matemática talvez desde a antiguidade(?). É só isto que tinha a acrescentar.

    Cumpts,

    JR

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    1. Caro João,
      não, não foi nada "cortar para canto", foi um alívio para a bancada, porque você já tinha insistido em subir por essa ala, chutando para fora, em vez de cruzar, parecendo que queria jogar para a estatística dos movimentos ofensivos.
      Pronto, agora temos um novo remate à baliza.

      Só que é um bocadinho à figura do guarda-redes, e passo a explicar como encaixo sem dificuldade.
      O João está a assumir que as representações, por exemplo das "Vénus", eram num sentido de divindade, mas isso é uma mera especulação actual... o que lhe garante que não seriam caçadores nostálgicos das suas amadas, e que não tendo uma máquina fotográfica faziam o que lhes parecia menos mal, ou a que davam mais relevo? Por isso esse remate é tipo balão, que parecendo ir alto, não passa por cima.
      Depois, não é nada claro que não existam representações numéricas nas cavernas. Há bastantes traços, pontos, ou outros sinais, veja:

      https://alvor-silves.blogspot.pt/2015/07/estado-da-arte-2.html

      que indiciam não só um conhecimento de quantidade, como também um raciocínio geométrico, podendo representar plantas.
      Neste caso, poderá ter assumido que eu iria sair da baliza, mas não foi esse o caso.

      Já agora, obrigado por ter respondido. Esqueci-me de pôr no fim de onde tinha tirado a citação:
      https://alvor-silves.blogspot.pt/2014/06/porque-sim.html

      Veja a última parte "Que estão".
      Verá que a frase final daí, foi a que coloquei na minha resposta...
      Se reparar ainda na data, perceberá que certamente nada tinha a ver com o João Ribeiro, que em 2014 não comentava aqui.

      Simplesmente há disposições e pré-disposições de que as pessoas nem se apercebem quando iniciam uma conversa. Inclusive eu mesmo.
      Foi por me ter apercebido disso com diversos exemplos de conversação, uns mais bizarros que outros, que pensei um pouco no assunto.
      Se não for à bola, com a comparação com a bola, peço desculpa.

      Abç

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  9. Caro Da Maia,

    Pode verificar, basta reler, que eu nunca me tornei ofensivo/defensivo, para usar o seu termo, senão em resposta a alguma ofensa ou tentativa prévia. Simplificando, nunca partiu de mim essa iniciativa. De resto, eu não assumo nada, é o que está estabelecido pelos "especialistas", valendo o que isso vale e o que se diz é que são representações de divindades. Assumpção é dizer que traços e pontos indicam raciocínio matemático, e eu não digo que não, poderão ser, simplesmente acho se por essa altura já tal representações matemáticas tão evoluídas fossem usadas, mais cedo teria a matemática sido devidamente conhecida e usada e representada. Já agora, o primeiro vídeo está indisponível.

    Pode usar as metáforas que quiser, eu por mim não gosto de futebol, acompanho a selecção por capricho patriótico mas de resto não é mesmo a minha praia. Isso não invalida que não possa usar os termos futebolísticos que desejar.

    Cumpts,

    JR

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    1. Caro João,
      como terá percebido, de novo o seu comentário ficou preso no spam.
      Não vou responder à questão do ofensivo/defensivo, porque como bem diz, basta ler o que foi escrito.

      Se tomar como certos os "especialistas", creio ser uma total perda de tempo, sua, andar a ler o que eu escrevo. O argumento "magister dixit" é vivência medieval, ainda que o queiram fazer regressar em força.

      Portanto tudo o que os outros dizem não é assumpção, mas o que eu disser já é... e portanto, os argumentos que levam às conclusões não interessam para nada?
      Bom, mas interessa que rematou bem, argumentando que a matemática deveria ter evoluído mais rapidamente. Sim, mas então e a pintura?
      Pinturas posteriores comparadas com algumas rupestres, são como desenhos de crianças comparados com da Vinci. Essa foi aliás uma questão que abordei no "Estado da Arte".
      Acresce que, como sabe o que tenho vindo a escrever, sobre ocultação de conhecimento, também poderia entender essa observação como simplesmente provocatória. Pode não concordar, e achar que não, nunca houve qualquer ocultação... mas nesse caso, para além de estar a perder o seu tempo, está também a fazer-me perder o meu.

      Abç

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  10. Bom dia caro Da Maia,

    Bem, penso que os "especialistas" terão realizado estudos sobre o assunto e que isso lhes dá algum crédito mas ainda assim eu próprio fiz o reparo que ser "especialista" vale o que vale. Repare, eu até digo que podia ser realmente matemático, só não me parece muito provável. Depois há o verso da medalha invertendo o seu argumento. Ou seja: O que os "especialistas" dizem é mera assumpção, mas o que o amigo diz, já não o é?

    A pintura é uma boa questão e acho que ela evoluiu em vários sentidos. Distingo pelo menos dois. Um artístico e outro prático. Este último foi o da representação com sinónimos dando origem à escrita. Um certo desenho significava certo aspecto. O artístico vemos aparecer por essa antiguidade fora embelezando e muitas vezes simultâneamente transmitindo mensagem política.

    Eu não sinto que perco o meu tempo ao ler ambos os seus blogs, simplesmente tento não seguir cegamente tanto a história institucionalizada como a alternativa. Como também tenho cabeça e ideias próprias é normal que dúvidas surjam. Eu também comento posts concordando com o que diz e nunca me abstive de o elogiar.

    Mas se não quer que lhe ocupe o seu tempo, isso já é outra estória e estando no seu direito não lho posso negar.

    Abraço,

    João Ribeiro

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    1. Caro João,
      a única questão que diz respeito ao tempo usado, é saber se visa um processo construtivo ou destrutivo. Como é natural, não vou perder tempo com intervenções cuja intenção seja meramente destrutiva, sem justificação.

      Quando referi o caso das pequenas esculturas que são tomadas como divindades, não objectei dizendo que "isso não é consensual entre os especialistas". Expliquei exactamente qual era um argumento de objecção (e haverá outros).
      Em resposta, se quisesse argumentar com os especialistas, deveria ter ido procurar os argumentos deles contra esta objecção. Eu não conheço, parece ser apenas uma hipótese plausível que começou por ser popular, e depois foi ficando consensual.

      Pode perfeitamente invocar argumentos de especialistas, que eu também o faço, se concordar com eles. O que não é construtivo, é invocar "especialistas" sem argumentos, isso resume-se a nada.

      Acidentalmente, ficámos a discutir um assunto interessante, que eu não vi ser tratado por ninguém.
      É este tipo de circunstâncias que gosto nestas conversas.
      Seria uma pena ficar limitado pelo que "dizem os outros" sem sólida justificação.

      Como lhe disse inicialmente, é um assunto difícil, se quisermos ser sérios... porque nem sequer os primeiros envolvidos, os primeiros humanos, lhe saberiam responder inequivocamente a isso.

      O que lhe posso dizer é que se pensarmos na compreensão das crianças, vemos que rapidamente dominam a noção de número, e será talvez a primeira noção abstracta a estabelecer-se, juntamente com a noção de "posse". É claro que antes tem a noção de "mãe", "pai" ou "eu", mas dizem respeito a específicas e não abstractas pessoas. Certamente que nunca viu uma criança a desenvolver comportamento religioso naturalmente... é ensinado!
      E é ensinado quando? - Normalmente, relaciona-se com os medos.
      O recurso inicial da criança são os pais, e se os pais remeterem para os seus próprios medos, aí aparece a noção de divindade.
      Mesmo assim, não verá cedo uma criança a pedir ajuda a Deus, em vez de pedir ajuda aos pais. É mais natural vê-la incessantemente a chorar pelos pais, do que ficar calma esperando que uma divindade cuide de si.

      Talvez ache necessário um "especialista" em arqueologia e em pedagogia... mas tal coisa ocorre raramente em "especialidades", que são justamente muito cegas a outras disciplinas.

      A sua hipótese sobre pintura tem algum sentido, mas em nada diz ou desdiz o que argumentei. O traço fino das pinturas paleolíticas perdeu-se na passagem para o neolítico, e só o reencontramos nos persas e gregos, e não é na pintura, é na escultura (o que deveria ser mais díficil de conseguir).

      A minha única questão é manter a conversa no aspecto construtivo, de forma que possa servir a ambos.

      Abç

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  11. Olá,

    A estatuária pré histórica está estudada e sim não é consensual, mas fica a ideia geral até que uma explicação melhor a substitua. Os estudos andam por aí e eu para professor tenho pouco jeito. Mas oiça, o próprio facto de estar a dar tanto ênfase a este assunto dos "especialistas" a meu ver demonstra o pouco que tem a acrescentar sobre a verdadeira questão.

    Agora, os assuntos sérios. As crianças cedo aprendem que uma coisa é “um”, como artigo indefinido, não como número, não confunda. Aliás não descobrem que uma coisa e outra coisa são um resultado, até lhes ser ensinado. Podem saber que aquilo é uma coisa e que aquilo é outra coisa mas não têm a noção matemática da situação, de 1+1 =2. Isso é ensinado.

    Uma criança chora pela protecção dos pais mesmo quando eles estão ausentes e continuará a clamar por essa protecção pela vida fora assim que se veja em risco, mesmo quando os seus pais estiverem mortos à muito tempo. Esse medo, esse chamar por protecção “superior” irá originar a religião. Quando não se tem os pais para nos proteger, voltamo-nos para quem? E esse chamar do bebé por protecção, não é ensinada, é instintiva. E assim respondo-lhe com o seu próprio argumento.

    Deixo-lhe aqui um link que explicará a questão da matemática pré histórica melhor que eu e com sorte solverá esta pequena troca de ideias.

    http://www.storyofmathematics.com/prehistoric.html


    Cumpts,

    João Ribeiro

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    Respostas
    1. Bom, com calma, experimente ler quem trouxe "os especialistas" à baila, e continuou a referir-se a eles em cada resposta?
      - Um problema diferente é não querer ler respostas, e daí partir para um ataque desnorteado.

      Então as crianças conhecem a noção de "artigo indefinido", antes de aprenderem gramática? Essa teve graça.
      Digo-lhe mais, não só sabem números, como sabem propriedades.
      Lembro-me perfeitamente de perguntar à prole quanto eram 3+5, por exemplo, e depois perguntava então e 5+3, respondiam "é egal". E isso não tinha sido ensinado. Assim como, sem ensino, sabiam o resultado de somar zero. Isso foram coisas que me surpreenderam, tal como à minha mulher, pois pensávamos que isso iria baralhar, ou iriam fazer contas. A idiotice de achar que a noção de zero só foi obtida pelos indianos, é tão ridícula que não tem ponta por onde se lhe pegue.

      Considerar que a noção divina é instintiva, parece-me ser blasfémia no catolicismo. Como as noções instintivas são igualmente capacidade animal, percebe onde é que essa deambulação vai parar?

      Eu normalmente penso duas vezes antes de escrever... e como já nos aborrecemos, acho que vamos parar por aqui o assunto.

      Até porque, e isto repete-se, concluo sempre que mais do que estar interessado no assunto, está só interessado em contrariar o que eu digo, usando a primeira coisa que lhe ocorre, faça ou não sentido.
      Depois dessa vem com outra, e com outra, e com outra, nunca fica satisfeito, e eu perco a paciência...

      Pela minha parte, deixo-o sozinho com a resposta que definiu para si desde o início.

      Abç


      PS: Quanto ao link, lamento mas como deveria esperar, eu não falo de coisas sem saber, ou procurar saber, sobre o assunto.

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    2. Bom dia caro Da Maia,

      Permita-me antes de ler a sua resposta deixar aqui um acrescento ao que anteriormente tinha dito para não correr o risco de ser influenciado pela sua resposta de forma a ser o mais claro possível.

      Quando começou este nosso “debate” eu não sabia onde queria ir nem tão pouco se queria sequer partir mas sei agora onde quis chegar. Como não estou habituado a exercitar a massa cinzenta, ter assim estas ideias deixou-me em apoteose como que experienciando uma epifania. Exagero meu mas é mais ou menos assim. Calculo que deve ser assim que o caro Da Maia se sente quando tem as ideias que tem só que com a tranquilidade que a regularidade com que as tem traz.

      Hoje nas minhas habituais insónias comecei a matutar no que tinha dito sobre o medo e o facto da fé na protecção dos progenitores ter originado a religião. Por certo esta é a minha conclusão e sinto que todo este nosso tete a tete foi o caminho necessário para chegar a esta meta. Só lamento o tom arrogante que usei em certos trechos que escrevi, se bem que não fui o único. Cada vez mais abomino a violência seja ela física seja ela verbal. Esta conclusão tem obviamente 50% crédito seu mesmo que não concorde, pois não trilhei este caminho sozinho.

      Acho incrível como do pensamento concreto nasce o abstracto e por sua vez este é contaminado pelo concreto numa relação de reciprocidade. Veja, do pensamento concreto que é a crença na protecção paternal nasceu o pensamento abstracto aquando na longa ausência destes chamamos e desejamos por uma protecção que materialmente há muito não existe mas que num processo mental consciente criamos uma noção de uma entidade paternal que nos proteja mesmo quando os nossos pais há muito não existem. A expressão popular “Mãezinha do céu” ou a reza, “Pai nosso que estais no céu” fazem-me agora ainda mais sentido. É como um resquício desta origem ancestral da fé numa protecção paternal e superior. E assim chegamos ao ponto em que o processo mental que ocorreu para conscientemente criar a noção de uma entidade protectora, seja utilizada para criar outras entidades que nos solvam outras necessidades. Por exemplo, a abundância, fertilidade etc. Chegando ao ponto de criar uma entidade geral e global, o Pai de tudo. Digo que esta relação concreto-abstracto é reciproca porque se do concreto se formou o abstracto, assim no abstracto formamos uma imagem baseada na nossa experiência pessoal e concreta.

      De momento este assunto é claro como a água para mim, de futuro não sei. Só lamento não me conseguir explicar melhor.

      Cumpts,

      João Ribeiro

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  12. Olá novamente, já li a sua resposta.

    Ponto 1- Sim, eu comecei por mencionar "especialistas" de resto só os fui mencionando em resposta à sua menção a eles.

    Ponto 2- Eu não disse que os bebés têm a noção de "artigo indefinido", disse sim que usam o "um" como artigo indefinido, sem saberem o que isso é, claro.

    Ponto 3- Fala em crianças com idade de terem sido contaminados ao ponto de saberem números e contas, princípios básicos de matemática. Calculo uns 4 anos o que vem completamente fora do propósito desta conversa.

    Ponto 4 - Se o que eu considero verdade, outros consideram blasfémia, temos pena. Ainda assim, percebeu mal. O medo e a crença na protecção paternal é instintiva, a noção que criamos de Deus a partir daí não o é.

    Ponto 5- Eu não estou interessado em contrariar, estou interessado em debater quando não concordo. Não é uma coisa gratuita.

    Ponto 6- Ignorar o link, uma fonte informação quando insere em tantos comentários, links é contraproducente.

    E pronto acabei.
    Se não me provocar de modo que seja necessário eu intervir para me defender, deixo-o por aqui e como me tinha pedido, não lhe faço perder mais o seu tempo.

    Obrigado e abraço.

    João Ribeiro

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  13. Caro João,
    vou responder ao João das 9:48...

    Foi mais ou menos isso... ver as coisas ligarem-se claramente, e várias outras coisas fazerem sentido a partir daí, dá de facto alguma sensação de realização, e satisfação pessoal.
    Depois disso, ainda é mais aborrecido ser contrariado.
    Dou-lhe um exemplo, uma vez fiquei convencido de um assunto, e como tinha uma certa ascendência sobre um colaborador, consegui convencê-lo do mesmo, apesar dele estar inicialmente contra. Mas foi no momento em que ele cedeu, que, ficando sem oposição, pensei melhor no assunto e ficou aí evidente que era ele que estava certo. Esse tipo de "epifanias" eram muito enganadoras, e por isso reprimo-as friamente. Mas não reprimo o entusiasmo que trazem.
    O problema do pensamento é que ninguém sabe de onde ele vem:
    https://odemaia.blogspot.pt/2011/08/paradoxo-do-pensador.html
    simplesmente se aceita como sendo de quem o profere pela primeira vez... como se houvesse necessidade de lhe dar um dono!
    Digo-lhe mais, há quem saiba aproveitar-se disso... fazendo os outros acreditar que foram os próprios a descobrir ou a chegar ao assunto, quando se quer induzir alguém a ficar fanático de uma opinião.

    Sim, a religião será filha do medo, nisso creio que concordamos "mais ou menos" com Russell:

    https://www.goodreads.com/quotes/466499-religion-is-based-primarily-upon-fear-it-is-partly-the

    Abç

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