domingo, 15 de novembro de 2015

Ba-ta-clan, 150 anos

Na sequência do ataque armado a Paris, reivindicado pela operação do ISIS (Estado Islâmico do Iraque e Síria), o nome Bataclan ficará associado ao maior drama recente que atingiu Paris.

Teatro do Bataclan, por volta de 1900, quando ainda era visível
a inspiração como pagode chinês na sua construção. 
Esta sala de espectáculos, tal como o Folies Bérgeres, ou o Moulin Rouge, tinham-se tornado ícones parisienses, vindas da Belle Époque do final do Séc. XIX, e que resistindo às transformações da cidade, mantiveram-se em funcionamento até ao Séc. XXI. Estiveram ligadas a um modo de vida burlesco exportado pelo imaginário cultural parisiense que se espalhou pelo mundo. Por exemplo, em Portugal, o nome Bataclã esteve ligado ao cabaré da popular novela brasileira "Gabriela", estreada há 40 anos.

O teatro terá sido inaugurado a 3 de Fevereiro de 1865, e assim terá comemorado 150 anos no início deste ano, numa altura em que Paris estava ainda atormentada pelo ataque ao Charlie Hebdo.

Estes 150 anos fazem do Bataclan uma das salas de espectáculos mais antigas deste género, e o seu nome resulta de uma pequena paródia, uma "chinesice", escrita por Ludovic Halévy em conjunto com Jacques Offenbach, e que esteve na origem do sucesso inicial do compositor germano-francês:

BA-TA-CLAN 
a opereta
composta por Offenbach (com libreto de Halévy)

Esta opereta, grande sucesso de Offenbach, não foi estreada no Bataclan, mas sim numa outra sala de espectáculos histórica:

... inaugurada em 1855, justamente com esta peça Ba-ta-clan, cujo enredo justificaria ainda o aspecto de pavilhão chinês para o teatro que seria inaugurado dez anos depois. 

Este tipo de operetas ligeiras, associava o nome de "opera bouffe" ao estilo italiano de óperas bufas, e o enredo desta opereta Ba-ta-clan é bastante curioso, ligando-se ao período conturbado que antecedera o fim da segunda república, e a inicial restrições de liberdades com o imperador Napoleão III, sobrinho de Napoleão Bonaparte.

O nome soletrado de Bataclan é o de uma canção de rebeldes, localizados num cenário de um império semelhante ao chinês, que são apanhados no meio de uma conspiração contra o imperador Fè-ni-han.
Emprisionados, dois deles descobrem afinal que são ambos parisienses, e têm como principal objectivo regressar a França. Ela, Fé-an-nich-ton, era uma cantora em digressão, raptada pelos soldados do imperador, e ele, Ké-ki-ka-ko, era o visconde Cérisy, um náufrago mantido em cativeiro.

Numa charada típica destas operetas, o imperador Fé-ni-han, acaba por revelar que afinal também ele era francês, que para escapar à morte tinha assumido o papel do verdadeiro imperador, e que por não perceber nada da língua local, tinha por engano condenado homens justos à morte, o que gerara uma rebelião comandada por Ko-ko-ri-ko. Também Fé-ni-han apenas queria regressar a França...
Para não terminar... o próprio comandante da rebelião era francês, e como era o único que não pretendia regressar, a sua subida ao poder permitirá o regresso de todos os outros!


Esta historieta é entendida como uma crítica à França de Napoleão III, que começa por ser eleito para o poder pela 2ª República após a revolução de 1848 - um ano em que as revoluções populares se estendem por toda a Europa (em Portugal é o ano da revolta da Maria da Fonte)... num período que foi curiosamente apelidado Primavera dos Povos - de onde as pretensas primaveras árabes quiseram beber o nome, como cópia de má qualidade.
Vendo terminar o seu mandato em 1852, Napoleão III vê-se forçado a mudar a Constituição no ano anterior... uma técnica sobejamente conhecida - ainda hoje muito tentadora. Dá-se início ao 2ª Império que prolonga a extensão do seu poder enquanto imperador, até ser deposto em 1870, quando as tropas de Bismarck entram em Paris, perante uma França completamente humilhada na Guerra Franco-Prussiana.
Se no início Napoleão III contou com apoio popular que lhe garantiu a eleição, a sua auto-nomeação como imperador levou a um período onde tudo estava reprimido e sujeito à vigilância estatal, tal como era descrito na ficção do Ba-ta-clan de 1855.

Talvez a crítica mais subtil à influência chauvinista residisse no facto de toda a trama se resumir a acções inconsequentes de personagens - todas elas francesas, enredadas num contexto de um poder estranho que iam influenciando caoticamente, por mera condicionante de salvação pessoal.


A palavra Bataclan terá sido popularizada com esta opereta, mas o seu uso é anterior, referindo-se talvez como sinónimo de "tralha" (podendo ser usado como "maralha")... ou de acordo com a definição (pág. 75 de Dictionnaire Languedocien-François, 1785, autoria anónima - Mr. L.D.S.):

  • Bataclan, ou frusqin; ce qu'une persoune a d'argent et des nippes.
remetendo-se assim a origem da estranha palavra para a região Occitana de França.

Por outro lado, o nome escolhido para o imperador Fè-ni-han faz lembrar fainéant (não fazer nada), e o som "kokoriko" pode ser uma simples onomatopeia de galináceo.

Este apontamento sobre o Bataclan remete para alguma coincidência trágica nas circunstâncias que levaram à escolha daquele local para um ataque terrorista, trazendo o período da Primavera dos Povos das Revoluções de 1848 para um período que se manifestou 150 anos depois, começando com a revolução tunisina em 2010.
Tem sido salientado o carácter algo aleatório na escolha dos locais, e não se vislumbrará nada de muito concreto em contrário, sendo até mais natural ter prevalecido uma escolha mórbida no pragmatismo da sua execução e resultado.

No entanto convém não esquecer uma questão lateral, que só intriga pelo facto de ser mesmo demasiado lateral... se o problema do Estado Islâmico está ali implantado, parece nunca ter incomodado um estado que dá pelo simples nome de "Israel"...

Israel não é o alvo da ira descontrolada deste Estado Islâmico, porque parece haver finalmente radicais fanáticos que não se preocupam em combater os opressores dos palestinianos. Israel também não se preocupa em bombardear posições do Daesh, quando antes sempre se dispôs a atacar o Iraque de Saddam Hussein, ou até o Irão.

De tanto silêncio, parece claro que o Estado Islâmico incomoda os Estados Unidos, a Rússia, a França, e toda a Europa, mas isso não faz descolar um avião israelita, nem para salvar os legados históricos de Palmira... já para não falar em salvar as populações de refugiados, que seguem um caminho bem determinado... que não incomoda Israel.

5 comentários:

  1. Cidade das luzes vem dos candeeiros públicos a iluminarem Paris para combater o roubo... o quartier de la Sorbonne era da prostituição, como digo frequentemente la merde dos franceses não cheira a m... porque é francesa, são mestres do paraître, muito perfume pouca higiene.

    "La réalité parisienne est toute dans l'aspect : Être n'est rien ; paraître est tout."

    Num momento em que os britânicos fazem ultimato para a UE devolver soberania aos parlamentos nacionais dos 26 estados lacaios dos Franceses e Alemães, retirarem a obrigatoriedade de o € ser a única moda na UE e dizem estar em perigo a soberania do United Kingdom se isto não for aceite, que melhor fazer quando a desunião espreita e ameaça a queda do projecto napoleónico francês desta U? deixar passar uns atentados em Paris para convencer mais facilmente a desenvolver-se um FBI europeu e reforçar o embrião do exercito europeu em defessa de a um inimigo comum criado com intuitos expansionista imperialistas da francofonia que nunca desistiu do impor o seu império romano desde as ordens religiosas às lojas maçónicas o fim é o mesmo.

    Mais

    esquecem um islão oposto ao modelo "democrático" europeu/ocidental defensor do casamento homossexual e adopção, à pornografia, uma sociedade "democrática" europeia ocidental em decadência total dos seus valores morais judaico-cristãos que impõe o fim dos estados nações na Europa pelo método de tratados que escravizam os seus povos com uma moeda única controlada não se sabe bem por quem, contra o império romano católico houve uma forte oposição dum califado em que a maioria das pessoas preferiram ser "escravas" de Alá a serem escravas dum Duque Rei ou Papa, a história repete-se, esta "democracia" de direitos do homem à francesa está podre pois é integrista colonialista e sem moralidade nem espiritualidade.

    O problema é mais profundo que terrorismo versus democracia, é geopolítico de duas civilizações em guerra há muito.

    Não esquecer o plano de Nicolas Sarkozy de integrar os países magrebinos na UE recusado pela Angela Merkel, resultando as revoluções da tal primavera Árabe,

    Cpts.
    José Manuel CH-GE

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    1. Caro José Manuel,
      o problema sistemático da França, bem como de muitos outros, é ter queda para grandes coisas, mas não haver sítio onde isso caia.

      Muito bem apontada essa semelhança com o perfume... quer-se manter viva a todo o custo a ideia de que a aparência interessa mais que essência, e isso tem um caminho tão claro em direcção ao caos, que nem é profecia, é uma certeza lógica.

      A França tem essa característica dos ideais até ao momento em que sente o cheiro do império, e assim esses ideais são apenas usados para estabelecer um império francófono. Foi assim com os ideais revolucionários levados por Napoleão e esmagados pelos seus exércitos.
      A ideia de chamar os países do Magrebe era apenas uma impotência de não conseguir compensar a influência alemã a leste... chegou a ser ridícula, vinda do colonialismo bem bacoco.
      A França pura e simplesmente quer instalar o mesmo caos na Síria que instalou na Líbia, com o pretexto de primaveras que não são mais do que infernos trazidos por gabinetes possuídos por ideias diabólicas, pintadas de santidade.
      A ideia de prolongar o estado de emergência é um sinal de como se tenta ainda o controlo absoluto ditatorial, com um pretexto ridículo, quando nunca houve tanta capacidade dos meios de informação quanto hoje.
      Depois a opinião pública é contaminada com as ideias do perigo do vizinho ser inimigo, como se não tivéssemos passado a Guerra Fria com o perigo dos familiares serem o inimigo, por terem ideias radicalmente opostas. Aliás é bem conhecida a histeria que isso causou no tempo de McCarthy, em que qualquer um poderia ser acusado de ser comunista e trabalhar para os soviéticos.

      A maçonaria tem como loja mãe a loja de Londres, da qual a parte francesa é apenas uma filial. É claro que ambas as tendências se combatem na influência, mas de certa forma esse tira-teimas terminou há 200 anos, em Waterloo.
      Assim, aquilo que Londres decidir é o que ainda interessa, e se os portugueses quiserem apostar no outro cavalo, passam a servir de montado de alemães e franceses... se bem que mesmo assim os alemães evitam ostentar o mesmo chauvinismo.
      Abraços.

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  2. Acresce a interessante observação:

    http://biclaranja.blogs.sapo.pt/imprensa-noticiosa-1016518

    ... porque foi depois noticiado que um dos terroristas que atacou o Bataclan tinha pelo lado materno uma ascendência que remetia à Póvoa do Lanhoso, berço da revolução da Maria da Fonte, na primavera de 1846:
    http://odemaia.blogspot.pt/2010/12/brasoes-de-armas.html

    Pois para dourar a história das primas revolucionárias, só faltava mesmo ao Bataclan ligar-se também à Maria da Fonte, pela maternidade terrorista da Póvoa do Lanhoso.
    Manhoso, não parece?

    Cumprimentos,
    da Maia

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  3. Olá boa noite,

    Re: "Manhoso, não parece?"

    É caso para dizer aqui há gato:

    http://www.lavenir.net/cnt/dmf20151122_00739477/silence-radio-sur-bruxelles-les-chats-envahissent-twitter

    eu pessoalmente não acredito nem aprovo as revoluções.

    mas quanto às "Nada, porém, como o(s) milhar(es) de G3 que levaram sumiço nas revolvências do P.R.E.C."

    sempre apostei estarem nas mãos do PCP, aliás o livro que vem de ser editado sobre Cunhal querer fazer a guerra armada a Salazar fez-me lembrar a hipótese, não li,

    como não foram encontradas as G 3 foram provavelmente vendidas, talvez ao Irão, e aí o tal avião "cai" em Camarate, mais um "atentado" (para mim dos franceses... com Sá Carneiro seria mais difícil esta UE a mandar em Portugal...).

    Sobre essa alusão a uma Maria da Fonte portuguesa, suposta mãe dum terrorista belga, é para mim o resultado da etnia portuguesa ser ainda confundida com a magrebina, triste mas é assim, magrebinos muçulmanos francófonos têm muitas piadas de mau gosto sobre as portuguesas, em França houve muitos casamentos, entre portuguesas e árabes muçulmanos, as duas comunidades partilharam os bidonville de Paris nos anos 50, triste época da emigração a salto da mala de cartão.

    Agora estamos debaixo da bota do novo império romano UE, imposto sem revoluções nem invasões, como dizia o francês Jacques Delors quando questionado que fazer com o euroscepticisme em 87 ; "temos que lhes enviar beijinhos", o que eu traduzo por implantem a sociedade do glamour... e resultou.

    Aliás para mim a maior queixa ao regime de Salazar era o acesso a esse glamour, que a moralidade do Cardeal Cerejeira impedia, faleceu em 1977...

    Auto considero-me como budista (ex anarquista pacifista) onde a política e suas ideologias e todas as religiões do planeta são a erradicar, para sobrevivência da espécie humana, onde cada ser é único e individual, só os carneiros precisam de pastores, para depois serem devorados evidentemente.

    Cpts.
    José Manuel CH-GE

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    1. É isso, caro José Manuel.
      Se é bom pastor o que consegue manter a carneirada no carreiro, melhor ainda foi o que arranjou o cão para lhe poupar trabalho, e melhor ainda será aquele em que os carneiros preparam a lenha em que serão assados.
      A obediência canina... ou melhor felina, com que se acedeu no ridículo de partilhar imagens de gatos, acaba por mostrar como a vontade de obedecer dos carneiros supera a vontade de mandar que o dono já tem.
      O que diz faz todo o sentido.
      Abraço.

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