segunda-feira, 5 de agosto de 2013

O Abade e o hábito

Imagine-se que, ao passear por uma praia da Bretanha, nos deparamos com uma escultura destas:

- Restos de monumentos de civilização antiga, perdida?
Seria uma possibilidade... por perto encontramos outras esculturas igualmente estranhas:

Acontece que estas e outras esculturas na Praia de Rothéneuf são atribuídas a um padre:
vítima de acidente que o deixaria surdo e mudo (no registo municipal de 1894 de Langouet, é registada uma "dureza de ouvido"). Recolhe-se a uma praia de Rothéneuf, onde durante 13 anos vai fazer mais de 300 esculturas nos rochedos da praia.
 
O Abade Fouéré e algumas esculturas mais "naïves" nas rochas de Rothéneuf.

Portanto, toda a história é assim consistente. Temos um abade, que se isola e vai esculpir 300 obras no seu retiro. Essas obras são ainda hoje visíveis, excepto alguns totens e outras esculturas em madeira, que desaparecem em 1940 (não sei se antes ou depois da invasão alemã da França).

No entanto...
No entanto, esta situação levanta algumas questões interessantes.
Há outros casos semelhantes?... alguns que podemos ver listados aqui, em particular o Facteur Cheval, anterior a este, iniciado em 1879, e que pode ter inspirado a ideia.

Ou seja, para aqueles que vendem livros, enchendo os programas do "Canal História", dizendo que os trabalhos de maçonaria antiga eram algo só possível de fabricar com a ajuda de "civilizações extra-terrestres", os exemplos de realização individual são elucidativos de como essa ideia é exagerada e completamente dispensável... pode servir outros propósitos de alienação, com ideias alienígenas.

Efectuar grandes monumentos reside muito mais na vontade e determinação de os realizar, do que na capacidade e recursos técnicos ao alcance. Se há algo estranho, é não haver muito mais casos destes espalhados pelo mundo...

Bom, e como distinguir se se tratam de realizações recentes, ou mesmo de realizações antigas?
Na prática, sem registo histórico fiável, ou técnica fidedigna de datação, é um exercício de fé!
Podemos pensar numa história completamente diferente... qual?
- E se... e se o Abade Fouéré tivesse apenas esculpido apenas algumas das rochas, bonecos mais naïves, que contrastam claramente com outras esculturas de traço sofisticado?
 
... uma coisa são bonecos meio infantis (veja-se o desenho da casa), 
outra coisa são esculturas com alguma sofisticação.
Trata-se de obra do mesmo artista?

(fotos: waswoutch em tejiendoelmundo.wordpress.com)

Ou seja, será que a reclusão do Abade Fouéré não seria uma missão de despiste, com o propósito de evitar a completa destruição dos monumentos existentes na praia... a que ele juntou outras esculturas mais simples?

Acresce que a segunda imagem que aqui colocámos (parecendo a "velha da Serra da Estrela"), é uma pedra diferente, que teve de ser erguida para ser colocada ali... algo difícil de ser feito numa praia de calhaus, por uma só pessoa!

As esculturas em causa poderiam ter sido feitas em qualquer época, por qualquer escultor dotado, e não propriamente por um abade amador... talvez se tenha perdido o registo. 
Antes da menção ao Abade Fouéré, parece não haver muitas menções a Rothéneuf. 
Encontrei esta citação na Revue de Paris de 1841 (pág. 172), que fala de "esculturas e degraus gigantes feitos pela natureza", que se viam na entrada do forte :
Lorsque, du haut des remparts de Saint-Malo, l'œil suit, dans sa courbe régulière et gracieuse, le large ruban de sable qui tranche d'un côté sur le cordon d'écume, éternelle bordure de l'Océan, de l'autre sur la pâle verdure des miels, le regard se trouve arrêté par une masse de roches escarpées qui forment cap et s'avancent brusquement dans la mer. Le fort de Rotheneuf est perché, comme un nid d'aigle, sur l'extrême pointe de ce cap. Sa situation est telle que, vus de profil à une certaine distance, ses ouvrages avancés paraissent dépasser le bord et pendre, soutenus par une force inconnue, sur le gouffre qui mugit et tourmente incessamment leur base. Le côté du cap qui regarde la ville surplombe et forme comme un immense perron renversé, dont chaque marche serait un accident du roc, une saillie bizarrement découpée dans la pierre. Cet escalier géant, que nul être humain ne s'est sans doute avisé de descendre, a son dernier degré sur la plage, toute hérissée en cet endroit de rescifs aux pointes abruptes et dentelées. L'autre côté, qui domine la baie de Rotheneuf, descend par une pente, praticable il est vrai, mais bien rapide encore, jusque sur la grève. 
A referência não é muito significativa, e nada esclarece sobre a existência prévia de esculturas... também é natural que se tais referências existissem, elas não sejam do conhecimento público, dada a história oficial que tudo atribui ao Abade.
Neste caso, o Abade Fouéré fez o hábito...

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