Coloco aqui uma interessante sequência de comentários que troquei com "Anónimo" no blog Delito de Opinião, que ficou num texto (sobre That cher) ... as ideias contam.
Tendo convidado a que a conversa prosseguisse aqui, deixo o registo relevante, para que possa prosseguir.
Caro Anónimo,
por acaso, noutro post aqui
http://delitodeopiniao.blogs.sapo.pt/5334653.html
comentei sobre essa demissão da crítica individual, pronta a ser cliente de promessas vagas de felicidade.
Numa sociedade que apenas tolera ovelhas e carneiros, as excepções ou são cabrões ou arriscam ser bodes expiatórios.
Não creio que o problema tenha sido alguma vez vencer a morte, mas sim saber viver com ela. Porque as noções não se vencem, compreendem-se.
Isto acaba por ir de encontro ao que conclui: a vitória sobre as noções é a sua compreensão, só depois podemos considerar a sua aceitação ou recusa.
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De Anónimo a 19 de Abril de 2013 às 13:44
Caro da Maia,
segui seu link e estou de acordo com o que produz. Mas há algo que é necessário ponderar, traduzindo-o, nesta questão da "morte", da vida e da liberdade.
Repare bem, a compreensão nem sempre vence a noção. Quero com isto dizer que é necessário algo mais que nos leve a superar os limites que nos impomos, ou que nos impuseram. Uns falarão da força anímica, outros dirão que é poder da mente, outros ainda que são mecanismos biológicos (psicossomáticos), outros mais neurológicos (neurociência) e por fim o poder da fé. Sem dúvida que estamos falando do Conhecimento, mas o Conhecer não é só compreender a noção, mas sim aplicar esse Conhecimento.
Para que melhor compreenda onde pretendo chegar, chamo a atenção do prezado da Maia para algo que constatamos no dia-a-dia:
Em tempo algum tivemos acesso ao conhecimento, com meios extraordinários para aí chegar, como nesta nossa época. Temos cientistas nas mais diversas áreas, onde se incluem os teólogos. Todavia continuamos a verificar que sistematicamente falhamos e que todos vivem numa feliz depressão.
Quero com isto tentar chegar ao porquê desta realidade. E o que se me oferece transmitir a este respeito é o facto de cada grupo individualizar o Conhecimento, isto é, balizando-o na sua dimensão. É-me dado ver que aqui existe efectivamente um racismo científico e cultural que cria guetos e impede entrar na realidade e dimensão, útil também, do OUTRO. O caso português mais típico deste racismo cultural leva por nome doutor(a), esquecendo que a ciência ou a instrução nos habilita, repito, nos HABILITA, à aquisição contínua do Conhecimento, e não à posse do mesmo. Com esta afirmação entro na outra dimensão deste racismo, o PODER. É quando nos despojamos da Posse e do Poder que verdadeiramente somos livres, Livres de entrar no Outro, livres de sair de nós e, consequentemente, de legitimar a Autoridade despida de todo o Autoritarismo.
O regresso à "infância" (o termo cristão significa nascer de novo) não produz necessáriamente a infantilidade, liberta-nos antes da infantilidade sem infância (sem entrega, com preconceitos, com limites ao estabelecimento da confiança e até mesmo do acolhimento) que se produz na malícia também deste nosso tempo.
É verdade, na condição cristã a Liberdade surge com o conhecimento (Conhecereis a Verdade e a Verdade vos Libertará); é aqui que quero chegar em toda esta partilha: Só a VERDADE liberta, e esta é o combustível que produz o tal poder que levar por nome fé, força anímica, poder da mente... e faz mover o mundo e cada um.
Concluo com uma afirmação sobre a Sabedoria, retirada do Livro da Sabedoria 7,7: "Embora única, tudo pode, imutável em si mesma, RENOVA todas as coisas. Ela se derrama de geração em geração".
Por último, não se me escape a questão da morte: Aqui chegados, ela, a morte, é nossa irmã, porque só morre quem nunca deu e tudo tomou.
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De da Maia a 19 de Abril de 2013 às 19:01
Caro Anónimo,
este talvez não seja o espaço mais indicado para esta conversa - abusaremos da simpatia do Pedro Correia, pelo que convido-o a um link, clicando no "da Maia". Terei muito gosto em prosseguir a discussão.
Aliás, agradeço a sua reflexão, pois boa discussão permite sempre trazer novas ideias.
A felicidade e a verdade, aliás como outras noções ontológicas, não são individuais. Têm uma manifestação individual, mas estão longe de se esgotar na aquisição social que o próprio fez delas.
Daí surge que um indivíduo não será feliz enquanto sentir que tem potência para tornar outros felizes (os que sabe que não o são).
Mas, o principal, estamos de acordo, é a questão da verdade. A verdade define a nossa posição de partilha. Não podemos ser definitivos sobre o que é verdadeiro, mas podemos ser comprometidos recusando o que não é, recusando contradições.
Sendo a felicidade uma partilha, se for ilusória, se não assentar sobre a verdade, cairá à primeira contradição...
As nossas limitações não são um defeito, ao contrário, são uma virtude. A ilimitação limitaria a descoberta... Dou-lhe um exemplo ilustrativo.
Suponha que lhe concedem o desejo de tudo saber... qual seria o seu desejo seguinte?
- Daí a frase:
Be careful what you wish for 'cause you just might get it all.
A linguagem é uma dádiva divina. E uso a palavra divina sem necessária conotação religiosa. É divina porque nos remete para noções inexistentes na dimensão da experiência material. Une os seres pensantes para outras verdades. Por exemplo, as verdades na linguagem matemática não estão escritas em nenhuma realidade material, e no entanto emergem até na sua modelação.
Tem razão, há conhecimento de experiência, e outro que resulta apenas de uma modelação. As nossas experiências têm uma limitação, diferente da modelação. A compreensão sofre das mesmas limitações. Porém, será errado sofrer mais para compreender melhor o que é o sofrimento. Adianta mais compreender quais seriam as nossas faculdades em tais cenários.
Aí percebemos que há dois poderes. O poder que adquirimos, e que se manifesta nas nossas acções sobre os outros; e o poder dos outros sobre nós, a nossa impotência, que é o poder de saber lidar com as limitações.
Ambos são representados na Crux. De um lado, o poder de crucificar, do outro o poder de aceitar a crucificação. O primeiro é o simples poder arbitrário, o segundo é uma capacidade de se definir para além da impotência - essa é a cruz cristã.
Abdicar do poder, das faculdades que nos foram oferecidas, seria abdicar da acção. A questão principal é entendermos que não podemos ser felizes sozinhos, e assim, se não tentarmos essa felicidade comum, com o poder que temos, apenas iludimos a noção. Quem quis mais poder, mais responsabilidade tem em mudar isso, mais se sentirá responsável pela infelicidade alheia. Se tal não acontecer, só se for por ter um défice de humanidade congénito.
Fisicamente seria contraditório um universo reduzido às dimensões materiais produzir na comunidade humana noções que ultrapassam o próprio universo criador. Objectivamente, adquirimos capacidades além da experiência física. Por outro lado, somos convidados a viver outras vidas, nos nossos sonhos. Nelas entramos, delas saímos, com dramas internos que se desvanecem como ilusão perante cada acordar. Ninguém morre num sonho... acorda para estoutra realidade.
Isto são indicações sobre nós próprios, para a compreensão do que somos, do que entendemos como realidade e morte.
É nesse sentido que considero que a compreensão pode vencer medos carregados em noções mal enquadradas.
Distingo conhecimento e compreensão. Sabedoria passa por ser uma ou outra coisa.
Compreensão é muito mais profundo do que conhecimento. O conhecimento é essencialmente descritivo, não responde aos porquês... a Ciência contenta-se muito com os Quês e os Quantos, e foge dos Porquês.
Compreensão é ir aos Porquês... compreensão é "conhecimento do conhecimento", e nada há mais profundo que isso. Há muito "sábio" que não sabe isso... e a nossa sociedade ignora-lhe a diferença.
Sob essa perspectiva, a compreensão renova todas as coisas, pois acrescenta novo olhar de conhecimento sobre o conhecimento anterior, camada em camada, geração após geração.
Cumprimentos,
da Maia
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De Pedro Correia a 19 de Abril de 2013 às 22:30
Estejam ambos à vontade: esta caixa de comentários também é vossa.
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De Anónimo a 20 de Abril de 2013 às 00:06
Prezado da Maia, visitarei seu link e terei muito gosto em participar nele.
Uma vez que o Pedro nos ofereceu sua sala para esta reflexão, se o da Maia aceitar, continuaremos aqui com a presença dele e de quem quiser. Outros assuntos debateremos em seu site, mas gostaria de aceitar o repto que o Pedro me lançou à pouco tempo para que ficasse atento às suas produções, em resposta a uma questão que lhe coloquei sobre o modelo de sociedade que preconizava. Vejo neste seu post uma resposta à minha pergunta. Quero dar meu contributo.
Concordo com a primeira observação que o da Maia faz, a minha noção de felicidade é colectiva, desde que o colectivo saiba reconhecer o indíviduo. Na tradição cristã - um pouco, ou muito, às avessas neste momento - quando nos cruzamos com alguém a pergunta que se lhe deve dirijir nunca é de onde vens, mas para onde vais (quo vadis Petrus?). Por isto não acontecer o conceito de felicidade transformou-se numa espécie de martírio, porque os infelizes, como refere mais à frente, muitas vezes são os que revelam níveis de sanidade mais elevados. Como referi anteriormente, a identidade do indíviduo também se forma no colectivo, e é de uma violência extrema olhar para este tipo de ovelhas que não se enquadram num falso redil, por ser falso e não diferente. A diferença é útil e enriquece, mas a falsidade mata. Vivemos numa sociedade de imagem, e pior do que isto damos uma imagem bem distorcida daquilo que somos. Por isto mesmo não nos surpreendamos com a revolta e até mesmo com a incapacidade de muitos não se reconhecerem como parte desta família, a família humana, porque esses são resultado do nosso fracasso;
Sobre a Verdade, considero correcto o que afirma. Não obstante é necessário termos a percepção, a compreensão e o conhecimento dessa Verdade. Eu jamais poderei afirmar que sou detentor da verdade absoluta, mas eu sei o que é a Verdade. A Verdade é tudo aquilo que cria e recria, é construtiva, edificadora e unificadora. São estas as premissas que nos conduzem a uma realidade Maior. Logo, ainda que o conhecimento se espelhe em múltiplas faces e com as mais diversas modelações se não tiver como propósito as premissas anteriormente referidas é um falso conhecimento que só serve para dividir e destruir. É esta noção do que é mau, ou do que é o Mal, que nos permite paulatinamente trilhar os caminhos do Bem Comum. A Verdade insere, consequentemente Liberta. Esta Liberdade só o é se for integradora;
O Poder a que eu me referia é todo aquele que é exercido impedindo o Homem de crescer. É isto o pecado, a isto chama-se falhar o alvo, de onde deriva a palavra pecado (no Hebraico).
Relativamente à ciência, ainda que ela não coloque os porquês, a função dela é servir, no sentido do serviço. É aqui que devo colocar sempre a questão do porquê de ela não estar ao serviço de todos. Este apartheid a que me referi no anterior comentário é originário no sentido egoísta do ser que por sua fraqueza assim aje, julgando poder dominar. Assim, deve associar a domínio a noção de Poder que lhe referi e, consequentemente, à necessária renúncia que propus;
Ao referir esse convite a viver outras vidas nos nossos sonhos, o prezado da Maia reavivou-me um conceito que há muito partilho: A ciência está para a experimentação da mesma forma que a utopia está para a acção social. Sob o ponto de vista científico não existe contradição nesta minha afirmação, e nenhuma supera a outra. É por isto mesmo que nos é necessário despertar para uma nova realidade;
O medo é algo saudável, pois é um sinal de alerta, o que não é saudável é o domínio que ele possa exercer, impedindo esse despertar;
Sim, concordo que a linguagem seja uma expressão divina. Por isto mesmo eu afirmo que a Crux, melhor, Jesus, pela sua vida e morte revela-nos a divindade da Vida e da Morte. Daí não me repugnar a afirmação de considerar a morte irmã. Por isto mesmo a Crux não é só uma simples opção, ela transforma-se em revelação, porque nos convida a superar e a redefinir o conceito da Vida e da Morte. É a condição divina do Homem que fala.
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De da Maia a 20 de Abril de 2013 às 04:34
( Muito obrigado, Pedro :)
Caro Anónimo,
já estava à espera de uma resposta profunda, e fica complicado responder sem nos alongarmos.
Pelo simples facto de desenvolvermos esta conversa, cada um de nós manifesta-se apenas no outro pelo reflexo das palavras. Aceitamos a origem externa das palavras, e daí projectamos uma ideia do semelhante que as profere. Tem razão, não precisamos de perguntar quem é, ou de onde vem, interessa mais perguntar para onde vais.
Pior que a sociedade que ilude é a que silencia ou que lança o caos. Uma resposta ilusória ainda é uma forma de comunicação. Porém, como refúgio de falsidade, para evitar expor a sua contradição, a sociedade optou por abafar, por criar diversões, que evitam respostas. Na prática condena "quem questiona" a um isolamento, sem necessidade de prisão física.
Condenado a esse isolamento, só há que aceitá-lo como uma cruz. Ou seja, há que compreender as limitações, não abdicar da potência, sem ignorar a impotência.
Pode-se viver no meio de falsidade, sem comprometer o cometimento com a verdade. É uma escolha de caminhos, uma escolha de realidades.
O cometimento com a verdade aproxima-nos sempre mais dos outros, não sabe de quais, pois haverão alguns que se distanciarão pela falsidade. O caminho da falsidade poderá ser apelativo e sustentável durante algum tempo, mas cederá inevitavelmente pelas suas contradições. A lógica é implacável e incontornável.
Só a verdade pode unificar, porque a falsidade é fabrico deturpado de modelos desligados da realidade partilhada. Desligando-se da partilha, os que julgam isolar, estão eles a caminhar para o próprio isolamento. As cumplicidades cairão pelo desajuste do fabrico ilusório, que levará à desorientação individual pela perda do referencial de verdade.
A verdade nem sempre coincide com a noção de bem, porque a mentira pode evitar algo mau. Isso pode ser temporariamente admissível numa sociedade iníqua, onde a falsidade e a incompreensão imperem. Porém, essa desculpa pessoal de pouco servirá ao próprio quando esses argumentos deixarem de ser desculpa racional. Se persistir nesse caminho, acabadas as desculpas, estará a afastar-se da compreensão que lhe poderia ser devida.
A verdade liberta-nos da fábrica da mentira, porque a ilusão obriga-nos a conviver entre dois universos separados. Num fizemos algo, noutro faremos crer que não fizemos. A mentira obriga a fabricos sucessivos de ilusão, afastando o ser cada vez mais da realidade partilhada.
Se fosse apenas um problema humano, poderia pensar-se na arbitrariedade da verdade, mas a própria natureza se pronunciará sempre contra a mentira. Só quem negligenciar a potência natural, poderá considerar que se poderá sobrepor a ela. A curto termo isso pode acontecer, mas acho que nos entendemos que este problema se coloca a longo termo.
O poder pode estancar algumas manifestações de crescimento, mas não o crescimento. O poder só é um fim em si para quem considere algumas das suas manifestações. O Homem crescerá então no sentido de outras manifestações... e depois não nos podemos esquecer que há uma natureza imprevisível que pode ter uma palavra muito assertiva nestes desfechos.
Sob o ponto de vista estritamente teológico, se Deus criou os Homens à Sua imagem, não foi para que se distinguisse deles, mas sim para que pudesse partilhar a Sua natureza com eles.
A abstracção da nossa linguagem é uma parte divina porque nos coloca numa realidade que não é material, não é o simples reflexo do que vemos na natureza, como acontecerá na linguagem doutros animais.
O que nos distingue não é apenas o conhecimento, é sobretudo a compreensão, entendermos o conhecimento como própria matéria de conhecimento. Acima disso não há nada.
Chegados aí, o que nos separa das qualidades divinas são os desvios do nosso entendimento, e uma limitação.
A limitação, conforme disse antes, não é um defeito, dá-nos o prazer da descoberta. O problema maior são os desvios de entendimento, que atraem alguns mais para a sua natureza animal do que para o carácter espiritual. Porém, será essa natureza animal que permite uma explicação de criação, para além da intervenção divina.
Sendo todos criação de Um, só a linguagem permite a comunicação dos iguais, sem que nenhum se evidencie como "criador".
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De Anónimo a 20 de Abril de 2013 às 23:18
Prezado da Maia,
é eficaz na dissertação que apresenta. Já tinha entendido essa distinção que faz entre compreensão e e conhecimento. No meu comentário decidi simplificar a linguagem. Também concordo na afirmação que faz sobre a mentira. O nosso ditado reproduz que há males que vêm por bem. Porém, é necessário que não nos situemos só nessa vertente, porque há males irremediávies. E estes são o objecto dos princípios que partilhei. Porque há pessoas que "vivem" e morrem sem cumprir o que sentiam ser a sua missão. Certamente que, seguindo o seu pensamento, eu aceito que o mal desses é o fertilizante para o crescimento de outro, mas isto não anula o anterior.
O sentido de minha reflexão centra-se também no exercício, sempre que possível, de impedir tais acontecimentos. E isto não é uma luta individual, creio ser do interesse colectivo.
Por outro lado, se é verdade que nem só de pão vive o homem, esta afirmação também indica-nos, pelo nem só, que o pão é necessário. E nós sabemos da importância que isto tem no crescimento. Logo, é dever da sociedade crescer para impedir. E é dever porque estamos também perante uma dívida (creio que compreende).
Percebo o que diz no que respeita à linguagem, mas esta, segundo e seguindo seu raciocínio, não passa de uma ferramenta que só é eficaz se existir aquela tal compreensão. Concluo então que o divino permanece a um outro nível.
Platão criou uma triologia para chegar a esse outro nível: Ideias (Divindade), Demiurgo (um semideus, que esteabelece a ponte entre Homem e a Divindade) e o Homem, é piramidal, com o Homem na base.
O que se me oferece ver sobre Deus é a efusão do espírito agostiniano que me impele a buscá-l´O no mais intímo de meu intímo. Obviamente segundo a premissa do procura-te em Mim e procura-Me em ti. É essa semente de Vida Eterna que eu devo buscar no Outro também.
E em mim e em si que eu devo procurá-l´O. É em mim e em si, com o meu/nosso livre-arbítrio, que Ele mantém a Sua Obra de criação e recriação. Tudo o mais, as restantes manifestações, são sinais (a "natureza imprevisível", compreende?).
Aquilo que me refere "sobre os desvios do entendimento" é precisamente o que impede a semente de Vida Eterna germinar.
Estou em falta para consigo, devo agradecer a sua disponibilidade para esta partilha. Obrigado.
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De Anónimo a 21 de Abril de 2013 às 01:34
2 pequenas rectificações:
Na citação do Livro da Sabedoria, o´capítulo é o 7 mas o versículo é o 27 e não 7 como referido;
onde se lê triologia, leia-se trilogia. São os pensamentos de Platão sobre a Ideia de Bem (onde refere que o mal existe por ignorância), demiurgo e o Homem.
Obrigado.
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De da Maia a 21 de Abril de 2013 às 16:26
Caro Anónimo,
não estará em falta de coisa nenhuma, pois do que dermos por convicção não solicitamos retorno. Igualmente, muito agradeço a oportunidade de discussão, rara de ocorrer sobre matérias destas.
Primeiro, deixe-me esclarecer uma coisa, eu não advogo abdicar de lutar individualmente, a bem do colectivo. Aquilo que disse é que devemos compreender o que podemos fazer, o que se nos opõe, e porquê... No meio de falsos sinais, os nossos passos devem ser os mais racionais, porque só um raciocínio lúcido evita trilhos inconsistentes, objectivos impossíveis.
Podemos ler sinais invulgares para seguir numa direcção, mas sem saber de onde surgem, seremos instrumentos desses sinais, e não agentes racionais críticos, que questionam a origem, a natureza, e a interpretação dos mesmos. Muitas vezes são um mero desejo de realização do próprio, que exacerba o seu papel, que o vê como uma missão. Podemos ajudar-nos comummente na compreensão, mas nunca impô-la... convencer não é vencer, é convidar o outro a vir ser, com um vencer de "vem ser".
A língua portuguesa transcende no seu significado, convida, com vida, ao comum, como um.
Se a quisermos analisar, podemos ver inúmeros sinais, mas um sinal é um selho (ou sé), que traz conselho e não a guia, águia, condutora.
Ah!... e poderia continuar assim, sim, mas não abuso do uso.
No entanto, se o plural de sal são sais, o de mal indicia "mais". E tomo isto não como sinal, mas como um conselho, onde posso ver um saber.
Um dos males é querer sempre mais, e mais, e mais... até ao infinito e mais além. Ao Homem não chegam as suas dimensões, quer ser o que não é.
Pode andar, com um pé no chão, outro no ar, mas logo quer os dois no ar, para voar, sem perceber que se vai estatelar. Porque voar não lhe chegaria, nada chegaria, e o "mais" são males...
Um olhar que não se olha, não vê o que é, só verá o que não é.
Daí surge também o nível infinito, platónico, das ideias, do divino.
Esse não é humano, podemos vê-lo, como vemos o horizonte, mas sabemos ser insano iludir um alcance da linha que separa o céu da terra.
E, enquanto o Homem insistir em não compreender isto, não compreende nada. Continuará eternamente a ter na mente, caminha para o horizonte, sem ver o rasto do círculo que já percorreu na redondeza da terra.
Eternamente, é ter na mente, ternamente, a compreensão possível das ideias. Mais que isso seria imediatamente... uma mente imediata, que tudo logo quer ver, ficando sem mais nada para conceber, com saber.
Já dei saltos para saber que não quero voar. Quero ter o prazer de caminhar, com uma terra de referência para me sustentar.
Porque quando o salto parece vôo alto, perde-se de vista a terra, ficaremos sozinhos nas alturas, e é preciso reorientar para regressar, para comungar no comum, como um qualquer.
Ah... e só aí vemos que nada melhor do que saber ser um entre todos.
Há uma triologia, sim.
- O indivisível que é tudo, é ao mesmo tempo a unidade e o todo.
- O divisível que leva à dualidade que separa o eu do outro. É a única percepção que temos como certa, divide o eu do não-eu.
Isso encerra a tentação do espelho... de moldar o outro ao nosso modelo. "Be careful for what you wish..." porque o espírito infantil pode querer bonecos, mas nunca será feliz se a realidade for o modelo. Só se completa com semelhantes e não com bonecos.
- Por isso, há o terno... eterno.
Isso implica a recusa de querer tudo. Implica aceitar que só teremos acesso a uma parte do outro. Haverá o eu, o outro conhecido, e o desconhecido.
É o desconhecido que encerra os medos, os desejos, o imprevisível. É preciso compreender isso, antes de empreender em insanidades.
Ou seja, não adianta desejar alcançar o horizonte, nem o fim do arco-íris.
Mas, é claro, pode-se andar em círculos... sempre em círculos, até que o rasto seja fundo e mostre o arrasto.
Mais uma vez agradeço a sua simpatia, e a disponibilidade para uma discussão acessível e profunda.
Cumprimentos,
da Maia
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De Anónimo a 21 de Abril de 2013 às 21:12
Prezado da Maia,
Chegaremos a uma conclusão, que é a de que estamos no mesmo nível de pensamento, e mais ainda sobre o conceito de missão.
Antes de aqui chegar entremos nos sinais. O sinal a que me referia é um farol para conversão, no significado desta palavra, isto é, mudar de sentido. O prezado da Maia refere, e muito bem, os perigos dessa outra "missão", chamemos-lhe falsas visões ou falsas percepções da realidade que ocorrem sempre nos recém "convertidos". Esta atitude é a forma que estes encontram para abafar a sua culpa.
Missão é um serviço, mas um serviço que só pode ser prestado depois daquele outro estar consequentemente realizado: "Conhece-te a ti mesmo", afirmou o filósofo. È exactamente quando entramos em nós e purgamos a natureza dita imprevisível, porque o mal é sempre imprevisível, nunca sabemos aonde chega e a roupa que veste, que mais facilmente compreendemos o Outro, principalmente quem muito viveu e muito errou. Afinal nada de diferente existe no ser Humano. Mas este sentido de missão tem uma única componente: existe como proposta e não como imposição. Até porque quem pretende ser missionário deve ter em mente aquilo que tem a propôr, ou seja, o que conhece e compreende efectivamente e não o que supõe conhecer e compreender.
Como bem sabe, e por isto referi a falsa imagem que fazemos de nós, ao mostrarmos que somos diferentes dos comuns acabamos sempre por acreditar na mentira. É esta realidade que pretendo sublinhar, porque enquanto o Homem permanece no sonho nunca entra em si e não contraria aquela outra natureza que o liberta e se torna referência para a comunhão que descreve, com quem quer que seja e o permita. Quando o Homem sai de si, liberto do que o limitou, consegue perceber alguns dos muros que condicionam o seu próximo. E quem percebe isto, ou compreende, sabe qual o Caminho que pode apontar, mas sempre consciente que é um simples dedo que aponta e nunca esse Caminho, é o Outro que o tem de percorrer e trazer Novidades para que continuemos a crescer. Entrar no Outro é compreender e não dominar e/ou possuir. É isso mesmo que refere, mesmo que seja só uma parte.
Quero dizer também que é possível subir a mesma montanha, mas não pela mesma encosta; que se pode beber do mesmo vinho, mas não forçosamente pelo mesmo cálice.
Um dos princípios desagregadores da sociedade é a massificação de pensamentos e atitudes, que geralmente se confunde com ordem. Ela até pode parecer funcionar, mas só parece.
Falou no eterno, e eu falo na eternidade, consciente que esta é produto de uma ex-eternidade. Isto também é um dos domínios da razão. A teoria da relatividade surge antes mesmo de ser comprovada. Faço-me entender?
Refere a triologia, eu comprendo bem isso do Uno e do Todo. No conceito cristão esta unidade chama-se trindade. Ela é composta pelo Amor, o Amante e o Amado. São um só! Torna-se claro o meu exemplo?
Sim, isto é loucura, mas não é insanidade. É aqui que se fecha o círculo. Por isto mesmo também afirmo que só o Amor vence a morte, foi também esta morte que foi destruida na Crux.
Referiu em seu anterior comentário o tema da teologia. A teologia existe para ajudar o Homem que busca um sentido, falando-lhe de Deus de maneira plena de sentido, mas não as teologiazecas de pregação para encher o tempo e esvaziar o templo.
Sim, é necessário ter cautela com que desejamos, porque na realidade tudo o que pensamos vem a nós, em Absoluto (para o bem e para o mal).
Há uma outra palavra portuguesa que transcende em muito seu significado comum: Saber. Saber vem de sapere: sabor, conhecer, compreender. Quando afirmo que a refeição sabe-me bem eu estou a dizer que conheço a textura, os ingredientes, o cheiro... É toda uma parafernália de sentidos que o(s) alimento(s) nos oferece(m); é isto mesmo que a Verdade permite, misturar todas esta diferentes textura que se chama Homem, sabendo que cada Um é UM.
Sapere et vivere.
Cumprimentos, car da Maia
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De da Maia a 22 de Abril de 2013 às 04:59
Caro Anónimo,
parece claro que ambos fomos fundo na reflexão, mas certamente que por caminhos e motivos muito diferentes. No meu caso, procuro compreender o conhecimento religioso, interessa-me a cultura, mas sempre me distanciei do culto.
Se chamar ao bem comum uma missão, surge de ser egoísta altruísta... ou seja, o infortúnio alheio afecta-me, reflectir-se-à em mim. Colheremos sempre em nós uma parte das dores dos outros.
Não me interessa muito saber se há culpa de A ou de B, preocupa-me mais constatar uma inacção sábia. O A ou o B podemos prever que vão existir, porque se a figura teórica retirar vantagem, haverá sempre candidatos a actores para o papel desse personagem.
Se a previsão teórica não está feita, só se for por falta de estudo, por impotência, ou desvio da sapiência.
À profunda sapiência só poderá interessar o poder como forma de opor um poder sábio contra um poder insano. Essa é uma forma de proteger o bem comum, e isso posso bem compreender. Outra coisa é-me difícil, porque para mim é insano que o poder se possa constituir um objectivo em si.
Isso seria a tal visão infantilizada de quem se vai rodear de bonecos em vez de semelhantes.
Por opção de liberdade, sempre me afastei de compromissos com sociedades, clubes ou associações. Resultado desse afastamento, e alguma ingenuidade, só recentemente me apercebi das muitas máscaras que as envolviam. Ou seja, acreditei numa sociedade de indivíduos, e negligenciei uma sociedade de sociedades. Assim, nalguns assuntos é natural que apareça como o sujeito sem clube que fala de futebol...
Sim, há uma certa ex-eternidade, no sentido em que todos os destinos estão definidos. Uma malha complexa onde tudo se formou, simples ou divino... e para isso só encontro a perdida noção grega de Gaia. Repare, eu sou ultra-racional, e procuro usar noções partilháveis, porque a linguagem é partilha. Os sentimentos individuais não são partilháveis, não temos linguagem para isso.
Assim, quando fala na trindade Amado-Amor-Amante, posso entendê-la no sentido clássico do Pai-Espírito Santo-Filho. Mesmo isso remeto para um solipsismo divino associando o "eu" ao Filho, o "não-eu" ao Espírito Santo, e a junção dos dois num grande "Eu" colocado na figura do Pai.
O solipsismo identifica o "Eu" e o "eu", tal como na Trindade se identifica Pai e Filho.
Esse é um problema de filosofia solipsista, que conheço bem, e que só é resolvido ignorando o tempo, identificando o "eu" e o "não-eu", caso contrário entra em contradição racional. Adianto que essa filosofia nada explica em termos do não-eu, tornando-se estéril nesse aspecto.
O problema teológico é o mesmo. Não pode fazer coincidir o resultado com a geração, e só poderá dizer que Deus se criou a si próprio se O identificar ao Universo intemporal.
Essa identificação excluiria por completo a identificação a uma parte, ou seja, a identificação Pai-Filho.
Já não há nenhuma contradição se admitir que Deus é um resultado da criação do Universo. Com isso separa ainda a responsabilidade divina sobre os aspectos nefastos da vivência, colocando-O apenas na solução dos mesmos.
Compreendo a questão sobre a "teoria da relatividade", que independentemente de nesse caso ser uma mera hipótese física da moda, procura ilustrar o aparecimento de ordem por acção consciente.
De acordo, mas isso seria já uma escolha de caminho na malha, não é a construção da malha.
Ou seja, Deus pode definir/criar um universo, identificar-se com uma projecção nesse universo, desde que não se identifique esse universo com todo o Universo.
Para além disso, há ainda a questão do Paradoxo do Pensador, ou seja, um pensador, divino ou não, não determina o que pensa, apesar de crermos normalmente que sim.
Sobre o sabor do saber, só interessa para a linguagem o que é partilhável, porque o restante é exclusivo do próprio. Se faltarem as palavras... ou são necessárias, e serão definidas, ou então é conhecimento comunitário irrelevante.
Afinal, porque nos entendemos com tão poucas palavras?
Cumprimentos e renovo os agradecimentos pelas respostas interessantes,
da Maia
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De Anónimo a 22 de Abril de 2013 às 13:59
Prezado da Maia,
Vamos tendo um olhar sobre o conhecimento que fazemos sobre nossa condição e realidade. Parafraseando-o esse olhar edifica-se no conhecimento sobre o conhecimento, camada após camada. Quero com isto dizer que não nos devemos precipitar nas ilações.
O instinto religioso do Homem não é histórico, é o desenvolvimento desse instinto que constitui um excelente registo histórico. Conclui-se que a meta não são os estériotipos que construímos, e não podem ser, sob pena de negarmos a reserva sobre o conhecimento último. Mas uma coisa sei, na ciência, as experiências levadas a efeito, em diferentes camadas e tipos de conhecimento, não determinam o Absoluto, são necessárias novas abordagens sobre o que eram verdades anteriores. Esta é a malha. Como vê, o sentido religioso anda a par do método científico. Quero com isto também dizer que ambos devem ter como princípio a renúncia de serem donos da casa.
O seu pensamento sobre o «tempo» é limitado, eu escrevi sobre o intemporal. A adesão a Deus, sentido como uma presença em todos os tempos, leva-me a aceitar que só o Amor permanecerá para a Eternidade. Não é uma visão platónica, é uma constatação do real.
A questão de Deus não reside na ordem do «saber» nem da aquisição, crê-se na Liberdade como dom que não pode vir só por si. Da mesma forma o prezado da Maia, nem ninguém, não pode afirmar que Deus não existe pela ordem do «saber», isto só pode acontecer no âmbito da CONVICÇÃO (recomendo-lhe a leitura de Enzo Bianchi - Para Uma Ética Partilhada).
Por outro lado, convém salientar que até agora temos falado sobre a Criação e não sobre o Criador. Foi o da Maia que colocou a questão da semelhança (Se...), e leva-me a concluir que a sua construção sobre esta realidade se situa em anteriores camadas, não vendo o surgimento de outras sobre estas. Eu não respondi a estas suas interrogações (intimas), levei-lhe antes o meu olhar, para que visse o que eu vejo (é exactamente isso que escreveu: o Olhar e o Ver, são coisas distintas).
Escreve também sobre o "eu" e o "não-eu"; percebo. Mas o que é isso?
A atitude religiosa, neste caso o cristianismo, não se dirige ao não-eu, nem tampouco à alma, mas ao Homem. Não confundamos o rito e o culto com a essência.
Não existe uma responsabilidade divina no sentido em que a coloca, porque retiraria o livre-arbítrio. Mas podemos encarar esta relação como cumplicidade, tendo em conta um fim específico.
Quando coloco a questão de Deus, como referi, vejo-o na intimidade do Homem, ereconhecendo-Lhe o poder Criador e Recriador no Homem, mas não posso explicá-lo como autor de Sua própria Criação. Se alguém tentar explicar esta circunstância, Deus deixa de ser. É aí que reside sua dificuldade. O da Maia quer vê-l´O à sua/nossa dimensão; se assim fosse o transcendente ruíria.
A questão religiosa - e não a religiosidade - é o único meio que (re)liga estas duas dimensões.
Sobre a questão da trindade, na forma como a coloca: O Amor é o gene imutável que determina a natureza da Criatura, à semelhança de Seu Criador. Logo, este gene, permanecendo, determina o Uno e o Todo.
Diz-me também ser ultra-racional, permita que lhe coloca a seguinte questão: Como se entenderia um ultra-racional se não encontrasse o mesmo no seu interlocutor? É a razão que nos liga, mas no meu caso é a fé que a ilumina.
Claro que fomos por caminhos e motivos diferentes, mas com uma ligação comum: Compreender. Significa isto que ambos buscamos a mesma coisa, em encostas diferentes.
Todavia, há algo para além do que tenho partilhado. Há ingredientes que devem ser misturados por camadas, sob pena de se perder a textura e de não lhes reconhecermos o sabor.
Também grato, receba um cordial abraço.
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De da Maia a 22 de Abril de 2013 às 23:23
Caro Anónimo,
correndo o risco de abusar deste espaço, ainda bem que discordamos, pois isso torna mais interessante a discussão.
Não tenho uma visão niilista, e para mim as questões lógicas são irrefutáveis, é aí que assenta a minha racionalidade, sob pena de ser inútil qualquer discussão, de onde só restaria o jogo retórico.
Ou seja, quando falei em camadas de conhecimento, não considero haver nenhuma camada acima de "conhecimento do conhecimento", a que chamei compreensão, ou se quiser será o metaconhecimento, com noções abstractas.
Assumimos que um animal conhece pela interacção com o exterior/memória, mas não conhecerá o conhecer, ou seja, não formará noções abstractas. Acima, conhecimento de noções abstractas, leva ainda a noções abstractas. Percebe a razão pela qual as camadas não prosseguem indefinidamente?
Não estava a falar de acumulação de conhecimento...
Nas ciências não exactas, o método experimental pode levar à construção, à constatação, mas a explicação assenta depois sobre dogmas experimentais. Qualquer "falha experimental" colocaria logo em causa a teoria, não penso que a teologia queira assumir a "via experimental"...
Creio que me expliquei mal na questão da impotência, e ela é importante para a "liberdade". Liberdade implica acção, e que faculdade de acção temos que não seja "oferecida"? Há acidentes que nos incapacitam, que liberdade resta quando falha o corpo? A do pensamento? Nem sempre... a mais leve perturbação exterior condiciona-o. A génese de ideias não é pensada e, meu caro, nem saberá que ideias terá daqui a um ou dois minutos.
Por isso, de que liberdade falamos? Da ilusão que podemos moldar o universo? Da ilusão de que o universo espera uma decisão nossa para se definir no futuro?
Cada um sabe o que é o seu "eu", e a negação dele será tudo o resto. Não vejo como questiona o "eu" e fala em seguida do Homem, que é ainda mais vago como noção, sendo formado pela multiplicidade dos anteriores.
A questão do livre-arbítrio cai na mesma ilusão da liberdade, é igual. Repare, eu posso correr uma simulação computacional, e definir que os entes decidem, perante o cenário. Qual foi o livre-arbítrio dos entes, se eu defini até o cenário? A única coisa que não anteveria seria o resultado, antes de correr a simulação... mas fui eu que fiz todo o sistema.
Não se trata de ver Deus na mesma dimensão. Trata-se de inteligibilidade. Fora do inteligível, é fé, e sobre "convicção" pura, não há discussão - é dogma. Esvazia toda a teologia, reduzindo-a a um clique. Porque a fé não precisa de teologia, aliás reduz a teologia a retórica. Acho insano afastar a inteligibilidade divina, por imposição dogmática. Aliás, é uma recusa racional ao divino, e afastando a razão de Deus, eu diria que esse dogma humano, é-Lhe contrário.
A transcendência, ultrapassando-nos, pode ser inteligível. O que seria contraditório ainda, seria advogar que "Deus nos criou à Sua imagem", em simultâneo com a transcendência. Não sendo na questão da inteligibilidade, não foi certamente nas faculdades físicas ou mentais. Como entender então esta frase fundadora, que antecede os dogmas de fabrico humano?
O amor será uma entrega consciente, mas quando chegar ao ponto de abdicar da racionalidade que nos distingue das alimárias, então perderá a razão... nos dois sentidos do termo.
Peço desculpa, se considerar que o discurso tem algo agreste. Não questiono a sua racionalidade, mas permita que contraponha a minha.
Mais uma vez agradecido, e com um abraço,
da Maia
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De Anónimo a 23 de Abril de 2013 às 11:15
Prezado da Maia,
Não se preocupe com a questão do ser agreste. Numa orquestra existem vários instrumentos que a solo podem ter tons agrestes, mas no conjunto eles harmonizam-se e surgem excelentes melodias. Quando lhe referi a dificuldade não pensava na impossibilidade. Ao Homem tudo é possível, e tudo lhe é permitido, ainda que nem tudo possa ser conveniente. Ao colocar a questão «o que é isso?» pensava somente que o eu são asas que voam em direcção a outro eu (que é o Homem), e este princípio não nega ainda que questione. Também quando abordo a questão do conhecimento sobre conhecimento, camada sobre camada, estou simplesmente a referir o encadeamento, a malha, e não a tornar ineficaz o anteriormente alcançado.
O da Maia coloca uma questão pertinente, é ela: "Há acidentes que nos incapacitam, que liberdade resta quando falha o corpo?". A partir daqui entro no domínio daquela outra transcendência. Já vi incapacitados fisíca e mentalmente retomarem suas funções normais. A estes factos chamamos milagres, e são milagres porque as ciências exactas, ou ditas exactas, não os explicam. Escrevo isto porque os constatei, analisei e busquei respostas, sem as encontrar, na ciência. No meio destes milagres alguns dos miraculados não possuiam fé, isto é, simplesmente não acreditavam. O que me leva a concluir que não é poder da fé que transforma, mas sim algo que supera os próprios limites da fé, ou seja, que não depende do crente, do indivíduo, mas de algo que lhe é externo. Por isto mesmo não vejo qualquer contradição entre o que afirma e a inteligibilidade ou falta dela, isto é inteligível, ainda que não se explique de uma forma exacta, no sentido em que buscamos esta exactidão. Por isto mesmo essa questão que coloca sobre o dogma ser-lhe contrário (ao Homem) deixe de ter fundamento, nesta perspectiva. É também por isto que antecipando-me lhe referi que levava ao da Maia o que via (o Olhar e o Ver), mas o que eu vejo não o imponho, partilho-o, sabendo que por este olhar posso apontar-lhe referências para que, se assim o quiser, possa investigar.
A fé não retira a inteligibilidade, reforça-a, não a aliena. Quando coloco a questão da fé dissocio-a do fanatismo e do fundamentalismo, porque estes factos são próprios da condição do Homem e não da fé. Sim, há muitos que não crêem e ajem desta forma.
Porém, se a fé for produto de milagres, ou da expectativa do mesmo, ela não é fé, é antes um condicionamento, uma prisão. A fé é um acto livre e que se contrói, que é alimentada pela Esperança não esperançosa (faço entender-me?), que movimenta, que impele e que determina que a incapacidade e/ou condição do momento pode ser uma oportunidade para superar o presente limite. O que significa que a situação que se possa viver não deve ser vista como uma condicionante que impede o Homem de cumprir, chamesmo-lhe, o seu destino. Veja-se destino no sentido em que pode e deve continuar a cumprir o papel que desempenha no Universo, ainda que com alguma dor.
O da Maia ao citar o exemplo que citou colocou o sentido do limite. A fé retira esses limites que se impõe e permite alcançar esse outro instrumento a que chama compreensão, para poder avançar. A fé, tal como refere sobre a linguagem, é um instrumento, ela não é o dogma e não é o transcendente, é o veículo.
O da maia volta a referir a questão do "Deus que nos criou à Sua imagem". Para isto necessitamos entrar no mito, repito, mito da criação. O mito da criação diz-nos que Deus criou Adão e Eva, e que fez o paraíso, e que estes rejeitaram a proposta, negaram-no pela dita "desobediência". Mas a questão é mais funda, o mito revela-nos que o Homem possui duas naturezas: uma simbólica (Adama - Adão - que significa terra boa, terra fértil) e outra diabólica (diabolos significa separador) e que estas duas naturezas se confrontam, mas não pela entrada do pecado e sim da tentação (símbolizada na serpente). É este confronto que determina a vitória e o alcance do Reino que nos Habita. Se não respondi a tudo, por favor, lembre-me.
Abraço
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De Anónimo a 23 de Abril de 2013 às 14:56
Eu sabia que me tinha escapado algo, por isto voltei aqui e rapidamente concluo.
Ao referir o mito da criação prentendia chegar à questão da Liberdade e do Amor que colocou a meio e no fim de seu comentário.
A Liberdade de que lhe falo não obedece a um modelo de liberdade no sentido comum do termo (fazer o que quer). Esta Liberdade que se aceita é aquela que procede da transcendência e que justifica a tal cumplicidade que num outro comentário referi. Sendo que o Homem possui em si mesmo essas duas natureza, a Liberdade de que lhe falo é aquela que resulta da renúncia do mal, da natureza diabólica. Aqui chegado a Liberdade que aceito é esta, é exactamente aquela que me permite viver em Harmonia comigo mesmo e com o Outro.
A esta Liberdade devemos associar o conceito de Amor, porque o Amor é Serviço - foi isso que Jesus fez com a Sua morte de Cruz, um Serviço impulsionado pelo Amor -, Serviço que se presta ao outro depois do Homem se encontrar Liberto. Sim, servir é amar.
Vamos agora ao conceito da Trindade como o da Maia colocou: Pai, Filho e Espírito Santo.
Imagine uma vinha em que o Pai é o agricultor, o Filho a Videira e o Espírito Santo os benefícios que o Agricultor oferece para o crescimento da videira, para que dê frutos. Assim, o agricultor (Pai) cuida da terra, pela emanação de Sua Bondade (o Espírito Santo), e o Filho cresce e dá frutos. Se o crescimento se produz pelo Amor e pela Bondade, a Videira recebe essa natureza; se recebe essa natureza torna-se parte dela. Por isto mesmo dizemos que Jesus é o Salvador e n´Ele (re)adquirimos a filiação, ou seja, somos filhos no Filho, isto é, pela aceitação de Sua mensagem em nós. Por isto mesmo do Espírito Santo só lhe conhecemos as manisfestações, aquilo que em nós se transforma.
Todavia, para aqui chegar é necessário pedir chuva (o Espírito), e esta chuva vem com a oração.
Concluo com uma citação de Jesus: "Pedi e ser-vos-á dado, batei e abrir-se-vos-á, procurai e encontrareis".
Cordial Abraço.
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De da Maia a 23 de Abril de 2013 às 20:57
Caro Anónimo,
não me compete a mim dizer se respondeu a tudo, certamente não estou a inquirir. Cada um julga se encontrou ou não as suas respostas, perante a troca de ideias. Se me pergunta a opinião, devo dizer-lhe que creio que não, não respondeu. Mas isso será falha mútua, natural, ninguém esteve a estruturar o discurso, ponto a ponto, é apenas uma troca casual de ideias.
Por exemplo, voltando à questão da liberdade, do livre-arbítrio, usou a situação de impotência, mas agora para ilustrar transcendência. É uma outra matéria, não estávamos a falar de transcendência material, essa eu não questionei, mas sim de inteligibilidade.
Um milagre é perfeitamente inteligível, basta sair da redoma da ciência que não se questiona. Usando o mesmo exemplo da simulação computacional que falei acima, o seu criador pode criar excepções (semi-aleatórias), ou intervir directamente sobre os entes e cenário, pois é ele que define o sistema (a intervenção directa acaba por revelar uma necessidade de corrigir a programação, muitas vezes, reiniciar).
Outra coisa, eu disse é que o uso do dogma da fé, afastará a nossa razão de Deus (ininteligibilidade), sendo prejudicial à fé em Deus. Afinal é a razão humana o que nos dá espiritualidade, e nos levou à noção de divino, por contraste com as alimárias. Por consequência, esse dogma escolástico não aproxima de Deus, afasta Dele a racionalidade do Homem.
Não confundamos Amor, que é uma entrega racional consciente, com Paixão, que é um impulso instintivo a um apelo sedutor.
Sim, o Homem tem duas naturezas, a animal, que o prende à realidade onde nasce, e a racional/ espiritual que o prepara para outras realidades. E sobre a interpretação dos mitos e das etimologias, certamente que há muitas variantes.
Sob esse aspecto, eu não tenho dúvida da escolha, e fui até onde pude ir, em caminho pessoal, até nada mais ver em redor. Por isso, meu caro, eu tenho todo o interesse em que me mostrem mais. Até lhe agradeço que coloque questões, quanto mais complicadas melhor...
Curiosamente, no percurso, onde fui encontrar algumas pistas foi na mitologia grega de Hesíodo... e se as religiões podem ajudar mais neste assunto, creio que é indo olhar, com olhar de ver, os registos mais antigos.
Porque, meu caro, apesar da nossa profunda e interessante discussão, só consigo ver que a teologia continua embrenhada numa retórica circular, com noções mal definidas, variáveis ou circunstanciais, e que em última análise acaba por ir bater em dogmas que fundaram a Igreja, mas não fundaram a religião.
A fé tive-a até à adolescência, e sei bem o que significa... significa aceitar que a não-resposta é uma resposta.
Quanto à ciência, essa parece entreter-se na fase animalesca, nem sequer coloca as perguntas, para evitar dar respostas... As teorias do Big-Bang e afins sempre me fizeram rir, enfim, continuam a jogar aos dados com os bonzões.
E depois há a dívida grega... que é de facto impagável. Recomeçando atrás, com um olhar de ver, que Sócrates não teve, pode-se ir muito longe na filosofia, mais longe que o idealismo, que se centrou no "eu" e esqueceu o "não-eu", deixou-o com a ciência experimental, que trata tudo com a delicadeza de um torniquete.
Um abraço,
da Maia
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De da Maia a 24 de Abril de 2013 às 00:13
(...)
Desculpe, mas só agora reparei que havia uma adenda ao seu comentário anterior. De qualquer forma, a resposta anterior ainda tem a mesma matéria, já que volta enfatizar "transcendências" na sua resposta.
Porém, acrescenta um ponto diferente, que é a questão da "renúncia do mal". Eu não chamaria a isso uma liberdade, é mais uma questão de opção, que só se coloca quando pode optar conscientemente.
Sobre a "natureza diabólica" não o acompanho se me quiser dizer que há um mal inato. Há obviamente instintos animais, como referi antes, resultado da natureza animal. Só posso classificar como "maus" aqueles que causam dano aos outros. Outra noção seria arbitrária e discutível. Quanto aos que podem ser maus para o próprio, muito resultará de simples ignorância, pelo que só poderá saber isso pelo aprofundado conhecimento de si mesmo.
Não sei, mas também não vejo que estejamos em desacordo - resumiu muito bem com a noção de "harmonia consigo e com o outro". Só não concordo com uma "maldade inata"... talvez haja se chegar ao ponto da competição por sobrevivência. A maioria do restante mal, parece-me pura indução cultural.
No entanto, volto a insistir. Por imperativo lógico, o bem pode implicar um mal. Se a ausência de dor é um bem, concebe logicamente que haverá um mal que é a presença de dor. Se a vida é um bem, o seu terminus é entendido como mal. Há outros casos em que é inócuo - a abundância pode ser um bem, mas a simples suficiência não tem que ser vista como um mal.
Pela simples concepção teórica, poderá supor que há mal potencial em qualquer um. Ora a modelação de um potencial mal humano, deve ser considerada sem que se manifeste? Ou essa teorização é indubitável, ou resultará em erros, novos males. O procedimento correcto é saber o que fazer quando ele se manifestar, antevê-lo tanto quanto possível. Caso contrário, estará sempre em dúvida, desconfiando, sem razão, do seu semelhante. E quando são coisas "sem razão", não são racionais.
Sobre a alegoria da Trindade, compreendi, mas a mudança dos termos não altera a substância.
Também no solipsismo é a partir do "não-eu" que o "eu" cresce e adquire conhecimento próprio. Tudo isso é resultado do conjunto, do "Eu". Como vê, a comparação será a mesma, se usar os mesmos termos, conforme referi antes.
Acresce uma coisa, que não referiu e talvez aí não se justifique... há um equilíbrio entre o que pode ser o "eu" e o "não-eu"... ou seja, o "eu" não deve incorrer no risco, ou na tentação, de prever o "não-eu"... sob pena de se condenar a um mundo previsível.
Abraço,
da Maia
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De Anónimo a 23 de Abril de 2013 às 23:05
Usei uma metodologia, que foi a de confrontar. Como lhe referi a teologia deve ter um sentido prático, ajudar o Homem que busca um sentido, através de uma ascese.
O que o da Maia me apresentou foi um sentido místico da filosofia, e aqui tudo é válido.
Não pretendi seguir a lógica de seu raciocínio, porque se a seguisse teriamos que entrar na questão filosófica e até mesmo na época pré-cristã. Teríamos de viajar para as religiões do oriente médio, em particular a do Egipto, e certamente encontraríamos registos muito similares ao da filosofia cristã, sim, referi filosofia e não teologia.
As pergunta que fiz sobre a respostas que tinha dado tinha uma vez mais o propósito de mostrar o que se pensa e como se aje. Ainda bem que refere que ela não mudou muito, mostra ser consequente na Verdade que diz ter encontrado, através da Revelação.
É em torno de Jesus, o Cristo por antonomásia, que gira todo o aspecto da Boa-Nova, que é uma novidade perante o antigo, mas que afirmou que muito mais seria revelado em termos de conhecimento (escrevo isto evitando citações).
Evitei ao máximo o uso de expressões teológicas e os significados ou correspondências de certas afirmações no Hebraico, Aramaico, Grego e Latim.
A Igreja cristã foi fundada na Pessoa de Cristo, o dogma é outra matéria. Mas este, o dogma, ao contrário do que pensa, não decreta a corrente, é uma variável não determinante, ou seja, o dogma é para quem quer e não determina a Verdade Revelada. Tão simples quanto isto.
Todavia, o cristianismo questiona a natureza e procura respostas em todas as variáveis do conhecimento Humano, ao contrário de muitas correntes filosóficas e religiosas. O cristianismo incorpora também a filosofia e é pena que poucos conheçam o gnosticismo, por exemplo o Evangelho dito segundo Tomé que foi descoberto em Nag Hammadi, mas também os textos do mar morto. Significa isto que o cristianismo não fecha as portas à descoberta do Saber, simplesmente afirma a aceitação da Revelação.
Coloca a questão do "não eu" e na minha resposta pretendi simplesmente dizer que o "eu" é. Se o "eu" é não pode haver lugar para o "nao-eu", filosoficamente pensando, é pragmatismo.
Para satisfazer a sua curiosidade sobre os meus pensamentos fora da aceitação, a nossa civilização deve muito à antiguidade pré-cristã.
A mitologia grega está cheia de profecias, e muitas das divindades gregas são nomes que podem designar uma só pessoa, a saber, o Verbo: Dionísio, Apolo, Ártemis, Afrodite, Prometeu, Amor e Proserpina.
Héstia, Atena e quiçá Hefesto serão momes que correspondem ao Espírito Santo: Héstia é o fogo Central, Atena saiu da cabeça de Zeus depois de comer sua esposa - a Sabedoria (Métis), que estava grávida. Desta forma ela procede de Deus e da Sua Sabedoria. Ela tem como atributo a oliveira e o óleo, que nos sacramentos cristãos têm afinidade com o Espírito Santo.
E daí, caro da Maia? será que o conhecimento se anula pelo facto de se admitir Cristo como revelação do Verbo?
Centrei aspectos teológicos, mas há também questões mais académicas que lhe poderia desenvolver em torno das afirmações de Cristo. Resultaria isto em algum benefício?
Já tinha referido que «o instinto religioso do Homem não é histórico...», consequentemente, infere-se que o cristianismo não funda a religião, avançou.
Sobre o Amor e a Paixão afirmo que não se separam, fundem-se.
Caro da Maia, creio que ficamos com uma ideia do que poderíamos dizer e debater, mas já não é isso que pretendo, mostrar que sei. Termino com o poema escandinavo, muito anterior à introdução do cristianismo, a "Runa de Odin":
"Sei que pendurei numa árvore balançada pelo vento, nove noites inteiras, ferido de lança, oferecido a Odin, eu mesmo a mim mesmo. A esta árvore que ninguém sabe de que raíz saí. Ninguém me deu pão nem um corno para beber. Olhei para baixo, dediquei-me às runas, chorando aprendi-as, depois desci daquele sítio" .
Aqui encontramos os efeitos da Paixão de Cristo, existe uma relação misteriosa entre os dois; não? É esta a questão que lhe coloco.
Cordial Abraço.
Caro Anónimo,
ResponderEliminarsegue então, já neste espaço, a resposta ao seu último comentário.
Estou de acordo com o que escreve inicialmente, e também que o Evangelho de Tomé
http://en.wikipedia.org/wiki/Gospel_of_Thomas
é no gnosticismo uma notável peça filosófica.
Não sei se compreendo o que diz com
Se o "eu" é não pode haver lugar para o "não-eu"(...)
Nessa separação distingue-se o aspecto intemporal, da indivisibilidade, ou identificação dos dois. Penso que fala disso, e aí o "eu" identifica-se com o "Eu", com o todo. É completo no conhecimento, mas incompleto na compreensão.
Devo dizer que estamos já a falar de matérias que eu nunca vi tratadas em parte alguma, mas que fizeram parte das minhas reflexões pessoais de há 30 anos a esta parte.
Prosseguindo. A completude pelo conhecimento não satisfaz a compreensão, porque o conhecimento induz um devir temporal, que se revela imprevisível ao "eu". É nesse sentido que aparece a necessidade de compreensão do "não-eu", porque do ponto de vista do conhecimento poderia fechar-se, identificando o "eu" e o "não-eu". Foi nesse sentido que lhe disse que essa identificação era "estéril".
A compreensão do "não-eu" resulta de assumir a não identificação dos dois, mas como é óbvio só pode ser feita no "eu". Aquilo que digo é que um aprofundamento da compreensão do "eu" permite ir de encontro ao "não-eu", e pode ir-se longe, mas com perigos, que já referi... nomeadamente uma sintonia tal que levasse à ideia de previsibilidade.
Obrigado por partilhar essa reflexão sobre essa conexão de ideias pré-cristãs, que será sem dúvida pertinente, e tem bastante matéria de análise.
Deixe que lhe coloque desde já uma dúvida, de que forma distingue Verbo do Espírito Santo?
O que considero mais surpreendente, e tiro o chapéu, é afirmar que o Amor e a Paixão não se separam, fundem-se... porque no tal caminho que segui, cheguei à mesma conclusão, quando já estava embrenhado bem fundo. Só que para que nos entendamos sobre o que estamos a falar, deixo-lhe as questões. Isso pode acontecer quando? O que é necessário para que essa fusão venha a ocorrer? É que, como perceberá rapidamente, há perigos aí, que não podem ser negligenciados!
O problema, a raiz da árvore, que bem ilustra na sua menção à "Runa de Odin", deixo como resultado de minha reflexão o seguinte texto:
Arquitecturas (5)
Há claramente uma relação do texto que refere (e que não conhecia) com uma entrega total do "eu" ao "Eu", pelas provações impostas pelo "não-eu". Feito esse caminho de compreensão, que arrasta fundo, às noções mais elementares, à contemplação dos limites, à perda dos medos, à potência pela impotência, feito esse caminho, ao ponto de nada mais ver em redor, há apenas um caminho posterior - o de regresso.
Não se volta ao ponto de partida, chega-se com uma compreensão acrescida.
Agradeço por manter a profundidade da discussão, que creio permitir uma melhor compreensão do outro.
Abraço,
da Maia
ResponderEliminarDe Anónimo a 26 de Abril de 2013 às 22:14
(...)
Sim, da Maia, já aceitei a sua proposta e já respondi por volta da hora de almoço.
Vi este comentário no "Delito", mas devo dizer que não foi registado nenhum comentário, em nenhuma parte (nem como spam).
Não sei o que se passou.
Só lhe poderei pedir para repetir, caso não seja muito incómodo.
Cumprimentos,
da Maia